segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

O Mal Entendido

Miguel irmão de Sena, todos os anos chega em Pedro Avelino para passar as festas de Natal e Ano novo, nesse período do mês dezembro gosta de tomar umas cervejas, juntamente com seus familiares e amigos. No dia de Natal festeja na casa do cunhado Alvino, e no Ano novo casa de outros familiares. Num desses dias festivos, Miguel conversava com seu irmão Sena, e Sena expôs suas preocupações com as doenças que estavam lhe incomodando. Contou a Miguel que constantemente estava com enxaqueca, também com freqüência tinha crises horríveis de hemorróidia. Com o relato de Sena, Miguel ficou muito preocupado com a situação do irmão, passou a aconselhar:
--- Meu irmão, a enxaqueca ninguém fica bom, mas tomando algumas precauções se convivi muito bem com ela, tome uns remédios faça uma boa dieta, que raramente terá uma crise, agora hemorróidia você tem que fazer um tratamento com um proctologista.
--- Que danado de profissão de médico é essa Miguel?
--- É a especialidade do médico que trata de hemorróidas.
--- Tá certo, vou procurar esse médico.
Passada as festas do final do ano, Miguel foi embora para Sergipe, onde residia e trabalhava. Sena ficou sofrendo com suas doenças, sabia ele que aquele final de ano tinha sido terrível para ele, comeu tudo que tinha direito e também bebeu.
Quase todos os dias Erivan de Biguinha fazia visitas ao amigo Sena para conversarem amenidades. Nesta bela tarde em que os dois batiam papo, Sena contava seu rosário de doenças:
--- É isso mesmo Erivan, estou sofrendo mais do que couro de pisar fumo. O que mais perturba é a hemorróidia. Vivo com a boca do frasco pegando fogo. Miguel meu irmão indicou um médico para essa coisa de furico.
--- E dói muito? – perguntou Erivan.
--- Num dói não, queima como pimenta, tudo isso foi às extravagâncias que fiz nesse final do ano que passou. Comi costelas de porco assada na brasa, buchada de bode e pirão de curimatã, isso puxado à cerveja. Tudo isso que falei é o pior veneno para hemorróidia e enxaqueca.
--- É mesmo Sena?
--- É
--- E que médico é esse que seu irmão lhe indicou?
Creuzinha mulher de Sena estava na cozinha lavando os pratos, Sena gritou:
--- Creuza! Qual a especialidade do médico de boca de frasco que Miguel falou?
--- Protético!
--- É isso mesmo Erivan, protético.
--- Tem certeza Sena que é protético?
--- Claro, Miguel foi quem disse.
--- Então você não precisa ir muito longe, na cidade de Afonso Bezerra, aqui vizinho, tem um só do bom, Alarisio Junior, ele é até vereador.
--- Acontece Erivan que Alarisio Junior faz prótese dentária, e pelo que sei, boca de frasco não precisa de dentes, ela já tem pregas.
Erivan é um sujeito falante, não gosta de palavrões, enquanto Sena só conversa com sacanagem, deixava o amigo contrariado.
--- Sena esse seu linguajar é que me deixa intrigado. Você só fala palavras obscenas, um linguajar rasteiro, palavras chulas, como: boga, furico, boca de frasco e ruela, acabe com isso, fale as coisas como elas são, o nome cientifico é ânus. Outra coisa, a especialidade do médico é proctologista, e não protético. Protético é que faz qualquer prótese, não é só dentaria.
--- É mesmo Erivan, a especialidade do médico que cuida de furico é proctologista, era porque eu não me lembrava.
--- Só para finalizar, hemorródia são pequenos vasos que se dilatam no reto, por tanto, você é um hemorroidário, e o que é hemorroidário? São pessoas que sofre de hemorróidia. E uma boa tarde para você, desejos melhoras.
--- Vai Erivan, vai pra casa enfiar peido num cordão que é que você sabe fazer.
Erivan foi embora aborrecido com o linguajar rasteiro do amigo. E Sena penando com dores horríveis provenientes de suas doenças. Aquele dia estava atacado das duas, enxaqueca e hemorróidas, passou o dia deitado sem poder olhar para a claridade, a cabeça doía que parecia que ia voar a tampa, e lá embaixo a hemorródia queimava como brasa. Sena colocava pedra de gelo no ânus, não adiantava, naquele dia estava como nunca. Não tinha vontade de comer nada, só tomava água, do jeito que ia viraria corpo seco.
Á tardinha chegou o sogro e a sogra de Sena, Aldo Macedo e Dona Maria, os dois chegaram a cavalo, vieram de véspera para receberem suas aposentadorias no outro dia no BB. Creuzinha recebeu os pais, pediu que os dois se apeiasem e adentrasse a casa, e Aldo Macedo perguntou:
--- O que tem Sena Creuza?
--- Está doente, desde ontem de manhã cedo que está arriado.
Creuzinha ficou conversando com os pais, perguntando pela fazenda, também pedia noticiais dos irmãos. E sena amargurado dentro de uma rede, coberto da cabeça aos pés, sofrendo com seus males, a cabeça enrolada com hortelã da folha grossa e amarrada com uma toalha de rosto, e o furico queimando como pimenta malagueta, como dizia ele.
Creuzinha fazia tudo dentro de casa com rapidez, naquele momento preparava o jantar, e Sena gemendo dentro da rede. Todos jantaram e foram assistir à novela. Sena não quis comer nada, estava com estomago embrulhado, não se levantou para assistir o jornal nacional, que não perdia. Chegando a hora de dormirem, Creuzinha armou duas redes na sala para os pais. Aldo Macedo deitou-se, D. Maria também, só que Aldo Macedo não conseguia conciliar o sono. Quando de repente, Aldo escutou falas dentro do quarto, onde Sena estava com o Creuza.
--- Ai, ai, ai Creuza não agüento, assim não dá, passe Vick-vaporub na cabeça, passe bem na testa, ai, ai Creuza, ai Creuza. Não passe vick no pescoço não, passe só na cabecinha.
Aldo Macedo arregalou os olhos, puxou no punho da rede de D. Maria e disse:
---Maria está escutando?
--- O que Aldo?
--- Sena dizendo ai, e pedindo para passar vick-vaporub no cacete. Será que eles estão atrelando?
--- Não sei Aldo, vá dormir.
Aldo ficou de orelha em pé, e lá dentro do quarto, continuavam saindo vozes.
--- Creuza meu amor, será que passando Vick lá embaixo também melhora?
--- Sei não Sena.
--- Ai, ai Creuza, tá queimando feito a peste, eu não agüento, ai Creuzinha, ai Creuzinha, chegue mais pra perto, assim, assim mesmo.
Aldo Macedo puxou novamente no punho da rede de D. Maria.
--- Maria eu não amanheço o dia nessa casa, vou pegar meu cavalo e vou embora, onde já se viu, esse povo não respeita mais ninguém. E Creuza num disse que esse infeliz estava doente, como é que estão vadiando. É duro um pai escutar um cabra enfiando a vara numa filha é duro.
--- Aldo eles são casados, podem fazer o que bem entenderem no quarto deles, nós não devemos nos meter na vida do casal.
--- Eu sei Maria, mais pelo menos podiam falar mais baixo, quem já se viu uma zuadeira danada dessa, uns gemidos da molesta, parece cachorro grunino com frio na chuva. Só se escuta esse macho dizendo: ai Creuza. É duro um pai escutar uma latumia dessa.
Aldo metia o pé na parede se balançando na rede, com raiva do que estava acontecendo. E Sena sofrendo (sempre foi manhoso), reclamava:
--- Ai Creuzinha meu amor, chegue mais pra perto, chegue Creuza.
Dentro do quarto Sena sofria desesperadamente. Creuza fazia tudo que podia para aliviar o marido das dores dilacerantes que estava sentindo.
--- Creuza pela enxaqueca estou acostumado, o negócio é na boca do frasco, eu acho que não tenho mais nenhuma prega, devem esta todas com os elásticos esgarçados.
--- Para com essas besteiras Sena, você faz um alarido danado, papai e mamãe na sala estão escutando tudo.
--- Eu não sei não Creuza, até quando eu vou agüentar essa queimação na boca do meu foba.
--- Precisa você ficar com essa gemedeira parece que vai parir.
--- Você diz isso porque não é em você.
Passava das 2 horas da manhã, e Sena gemendo, e Aldo Macedo acordado se balançando na rede, escutando tudo que se falava no quarto do genro.
Sena já desesperado pedia para Creuza:
--- Creuza arranje qualquer coisa para passar no meu furico, tô que não agüento mais essa queimação.
--- O que você quer que eu faça, me digo homem de Deus?
--- Arranje qualquer remédio, banha de tejuaçu, banha de raposa, qualquer coisa para passar no meu cu.
Creuza começou a mexer nas gavetas a procura de alguma coisa para passar no ânus do marido.
--- Sena o que achei foi acentona.
--- Será que acetona é bom?
--- Não sei, só experimentando.
De dentro da rede, Aldo Macedo meteu a mão na rede da mulher, disse:
--- Está escutando Maria?
--- O que Aldo?
--- Agora vai ser com uma tal de acetona, pra que serve acetona Maria? Acetona escorrega, e como banha.
--- Eu sei lá Aldo, vá dormir.
--- Como eu posso dormir Maria, escutando minha filha vadiando e eu escutando, só fico pensando aquele calango magro em cima de minha filha, metendo a vara nela.
Aldo inconformado ficou de mutuca escutando.
--- Creuza coloque devagar, só um pingo.
--- Num é melhor com uma lã?
--- Então eu vou abrir as pernas.
--- Não Sena, é melhor de bunda pra cima.
--- Tá certo, agora quando for botar a acetona, abra as duas popas da bunda, depois assopre.
--- Aldo Macedo não agüentou, puxou novamente no punho da rede da mulher e disse:
--- Oia, oia Maria, está escutando a servegonhice?
--- Aldo eles são casados.
--- Maria será mesmo que eles estão dando uma reiada?
--- Aldo vou repetir pela última vez, eles são casados podem fazer o que quiserem.
Dentro do quarto, Sena administrava com Creuza como colocaria a acetona.
Creuza é melhor colocar a acetona numa bisnaga de desodorante, que dá uma borrifada só.
Assim mesmo Creuza fez, pegou a bisnaga de desodorante Rexona vazia, colocou toda acetona que tinha encontrado.
---Bote a bunda pra cima.
--- Deixe-me colocar um travesseiro debaixo da barriga, pra bunda ficar mais impinada.
--- Vamos Sena, se ajeite.
--- Vou borrifar.
--- Abra bem as duas bandas, acerte bem no centro, depois assopre.
Aldo Macedo sentou na rede, puxou a rede da mulher, disse:
--- Maria que danado de safadeza é essa, que esse povo está fazendo dentro desse quarto?
--- Não sei Aldo, vá dormir.
--- Eu não vou dormir não. Não consigo dormir com essa zoada de gente fudendo, eu vou já arrombar a porta desse quarto, e vou ver o que está acontecendo.
--- Você não é doido Aldo. Respondeu D. Maria.
Creuza estava se preparando para dar a borrifada, e deu. Sena deu um grito tão grande, que acordou o conjunto do IPE, Conjunto Donatile, bairro São Geraldo e adjacências.
--- Ai Creuza, me lasquei, a boca do meu cu encolheu.
Foi dizendo isso, e arrancou de cima da cama com toda molesta dos cachorros, abriu a porta do quarto, passou debaixo da rede de Aldo, deu um sopapo tão grande na rede que quase a cabeça do sogro bate nas telhas. Rapidamente entrou no banheiro, foi para debaixo do chuveiro, reclamava:
--- Chegue aqui ligeiro Creuza!
Creuzinha rapidamente também emburacou no banheiro, para acudir o marido. Aldo dizia a mulher:
--- Oia, oia, o que eu estou dizendo, foram terminar a safadeza debaixo d’água, tais vendo Maria, tais vendo o que tô vendo?
Dentro do banheiro Sena se maldizia de suas doenças.
--- Eu nunca tinha sentido uma coisa tão ruim como essa. Creuza vá ligeiro buscar a bacia de alumínio, eu encho d’água e sento dentro, assim no chuveiro é mesmo que nada.
E Aldo dizia para D. Maria:
--- Que coisa Maria, começaram a boca da noite e ainda não terminaram, agora vão fornicar dentro de uma bacia.
--- Aldo não julgue as coisas desse jeito, você muito precipitado nas suas conclusões, o seu pensamento só tem maledicências.
--- Oia, oia Creuza entrando com a bacia. Será Maria que dentro da bacia cabe os dois?
Creuza encheu a bacia com água, Sena sentou, foi um alívio. Sena parou de reclamar, ficou sentado um bom pedaço, foi inventar de levantar, a ardência começou novamente, sentou-se outra vez.
--- Maria parece que terminaram de reiar. O Sena é um garanhão da peste.
Aldo adormeceu, D. Maria também. Passava de cinco horas da manhã, quando Sena saiu de dentro da bacia tremendo de frio, deitou-se e adormeceu. Creuzinha não se deitou, foi fazer o café do pessoal de casa. Aldo levantou-se, D. Maria também, sentaram a mesa para tomar café, e Aldo perguntou a Creuza:
--- Que danado de Zuada era aquela, dentro do quarto?
--- Era a hemorróidia de Sena que atacou, e ele mandou passar acetona, aí teve que ir para dentro da bacia com água, estava queimando muito.
--- Assim tá certo, eu pensei que vocês estavam fazendo outra coisa.
--- Que outra coisa papai, diga?
--- Oia Maria, oia, eu bem que disse, deve ser alguma coisa com as doenças de Sena.
Aldo e D. Maria, tomaram café e foram para BB receberem suas aposentadorias. Creuzinha foi trabalhar na Prefeitura, e os dois filhos para Escola. Sena ficou deitado, amargurado em cima da cama. Passaram-se três dias, Sena ficou bom da hemorróidia. Sem querer passou a unha na boca do frasco, como dizia ele, e arrancou uma casquinha, quando olhou era a pele da boca do frasco com prega e tudo, e bem redondinha, parecia uma tampa de cerveja, cheia de preguinhas.
Ainda hoje Sena tem bem guardadinha numa caixa de fósforos, as impressões digitais do ânus. (a pele). O nosso amigo Sena até hoje, nunca mais sentiu nada de hemorróidia, só continua com enxaqueca, não pode ver comida.



Manoel Julião Neto.

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