segunda-feira, 14 de setembro de 2009

BAR, RESTAURANTE E LANCHOTE SÃO SEVERINO DOS RAMOS

Pedro Avelino desde os seus primeiros habitantes foi uma cidade muito hospitaleira, aqui sempre chegou para morar muitas famílias de outros estados e de outras regiões, isso desde os tempos que chegou a estrada de ferro.Todos sempre foram bem aceitos. Reside aqui pessoas da Paraíba, de Pernambuco do Ceará, Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo, também muitas pessoas de cidades do Rio Grande do Norte.

Em um dia desse, numa boquinha de noite, estaciona no quadro do mercado um caminhão velho, caindo os pedaços, proveniente do estado da Paraíba, mais propriamente de uma cidade chamada Solanêa. A carroceria do caminhão estava superlotada de cacarecos, como: um guarda-roupa com a porta arrancada, um camiseiro com uma corda amarrando no meio, para as roupas não caírem, um monte de tábuas velhas cheias de cupins, cadeiras de modelo antigo, duas camas de solteiro, uma de casal, os colchões de capim vinha dentro de sacos de estopa, duas trouxas imensas de roupas e redes entesadas, quatro potes pequenos, uma jarra, dois tonéis de plástico azul de 200 litros, quatro baús, duas malas feitas de imburanas, dois fogareiros de carvão, dois textos de ferro para fogão a lenha, quatro quartinhas e uma espreguiçadeira. Misturado a tudo isso, vinham panelas, pinico, baldes de alumínio, um cachorro vira-lata amarrado com uma corda pelos garguelos no canto da grade do caminhão, um papagaio se equilibrando dentro de uma gaiola de arame, dois garajaus com galinhas, patos e perus, um burro e uma carroça. Na boleia estavam, um senhor negro, magro com a carapina ficando branca, uma senhora de cara larga, branca, gorda e uma filha, magra de venta fina, alta, feia de doer, perguntando por uns parentes que moravam na rua do cemitério. João de Dionísio prontificou-se a ensinar onde morava os parentes da família, o senhor da carapina ficando branca mandou João de Dionísio subir na carroceria, o vira lata que estava amarrado, quis logo morder João, João meteu-lhe o chute, quebrou o cabresto da sandália. O caminhão arrancou, João desequilibrou-se, caiu por cima da gaiola do papagaio, o bicho gritou, João ajeitou a gaiola. O caminhão seguiu para rua do cemitério aonde os parentes da família vindo da Paraíba moravam.

A população de Pedro Avelino viviam encafifados, sem saber o motivo que aquela família tinha vindo morar em Pedro Avelino. O casal e a filha trabalhavam dia e noite para sobreviverem, a mulher que se chamava Doralice, fazia bolos e tapiocas para vender na rua, o homem fazia carvão, chamava-se Seu Chiquinho, e a moça muito comprida e feia, com a cara muito fina, com uns shorts cortando as virilhas, chamava-se Sandra, só que a mãe a chamava de Lindinha. Era uma família que vivia para o trabalho, ninguém tinha folga de nada, trabalhavam sábados, domingos, dias santo e feriados. Se tiver festas no centro da cidade, lá estavam os três, vendendo bolos, milho assado, tapioca e cachorro quente. Aproveitavam qualquer ocasião para ganharem dinheiro, até no dia de finados vendiam na porta do cemitério, velas, caixas de fósforos, coroas de flores, bolos, tapiocas, cocada e água gelada, eram uns verdadeiros mouros.

Na labuta do dia a dia, conseguiram juntar algumas economias colocaram uma banca na feira para vender café, bolos, tapiocas, carne de bode torrada com arroz e farofa, buchada de bode e cachaça, o bode torrado de Dona Doralice era gostoso, a buchada nem se fala, o cheiro tirava o Padre da missa. O cheiro da comida de Dona Doralice impregnava todo o centro da cidade, deixavam todos de água na boca, contaminavam as narinas mais insensíveis que passavam por perto de suas panelas. Dona Doralice era mulher malcriada, gasguita, braba que parecia uma cobra quando perdia o veneno, quando estava com raiva dizia muitos palavrões cabeludos, falava palavras erradas, típica de pessoas do brejo da Paraíba, Sandra acompanhava a mãe na malcriação, os meninos da rua colocaram o apelido em Sandra de suvela, na escola, Sandra brigava todos os dias. Dona Doralice usava um pano na cabeça, nunca o tirava, usava umas bermudas de malha, bem colada no corpo, por ser muito gorda, a costura da frente da bermuda ficava repartindo a testa da vagina, mais ela não estava nem aí. Era uma mulher destabanada, que falava palavrões, detestava pinguço, na banca dela biriteiros desocupados não encostavam, ela ameaçava todos no cacete. O marido era calmo, Dona Doralice manobrava com ele, dava-lhe gritos na frente de todos, o pobre do Seu Chiquinho, era paciente, o seu trabalho na banca de café era atiçar o fogo e lavar os pratos, xícaras e talheres. Logo os pinguços de Pedro Avelino, que detestavam Dona Doralice, lhe botaram o apelido de Chico Corninho. Os pinguços também colocaram o apelido em Dona Doralice de Cachorra Louca, ela ficava possessa da vida, quem a chamava dessa maneira, ela queria cortar no facão, diziam as más línguas, que Dona Doralice veio fugida de Solanêa. Seu Chiquinho tinha entrado numa briga por causa dela, no meio da briga ela tinha dado uma facada no opositor do marido, por isso tinha vindo se esconder em Pedro Avelino. À tardinha quando eles desarmavam a banca de café do meio da feira, a pinguçada que não gostavam dela, metiam o grito:

--- Já vai pra casa Cachorra Louca!

Ela respondia:

--- Venha dizer aqui perto de mim, bando de corno fela-de-uma-puta, venham, que eu toro tudinho no facão, vão procurar o que fazer vão arrumar uma lavagem de roupa, tomem conta da vida de vocês e deixe a nossa em paz, bando de cachaceiros sem vergonha.

Ia embora carregando suas panelas e caldeirões, Seu Chiquinho carregava a banca de café na cabeça. Lindinha como chamava Dona Doralice, carregava o saco de carvão e a maletinha do dinheiro.

E essa vida de trabalho duro, durou por muitos e muitos anos, o trio de trabalhadores conseguiram guardar umas economias, compraram um prédio, no centro da cidade, reformaram tudo, compraram mesas, frízer, cadeiras, equiparam da melhor maneira possível, com som, aparelho de DVD, televisão colorida, tudo organizado, viajantes, funcionários do Banco do Brasil, funcionários públicos que estavam de passagem por Pedro Avelino faziam suas refeições no bar de Dona Doralice. O seu tempero era falado em toda região, quem vinha a Pedro Avelino e não comia o bode torrado, e a buchada de Bode de Dona Doralice, não tinha conhecido Pedro Avelino. Os temperos de Dona Doralice atravessaram fronteiras, veio até uma jornalista de uma revista de culinária do Rio de Janeiro fazer entrevista com a Dona do Bar, Dona Doralice estava ficando famosa, Foi até o programa de televisão, Mais Você de Ana Maria Braga, para preparar uma buchada para os telespectadores. Nas paredes do bar de Dona Doralice, as paredes tinham assinaturas de gente famosas, a foto dela com Ana Maria Braga, estava pendurado num quadro no centro da parede de entrada do bar. Reportagens de jornais e revistas com Dona Doralice enfeitava as paredes do salão principal do bar.

Então Dona Doralice ampliou o seu estabelecimento, aumentou o salão, colocou mais mesas, deixou tudo mais chique, mandou Junior Cacetinho pintar em letras garrafas de cor vermelho berrante, o nome do bar, que era: Bar Restaurante e lanchonete São Severino dos Ramos. Um pinguço chamado Zé Veneno que ia passando, disse:

--- O nome desse bar está errado, devia ser Bar do Bucetão, a dona só anda com a buceta repartida no meio.

Quando Dona Doralice escutou, partiu para cima do biriteiro, dando lhe de cabo de vassoura, o pinguço correndo e dizendo:

--- Calma Cachorra louca, calma...

Debaixo da cobertura do mercado, estavam uma base de uns 15 pinguços, todos detestavam Dona Doralice, por ela não deixar eles entrarem no seu estabelecimento comercial, dizia ela que eles eram muito pidão, viviam pedindo dinheiro, pediam para pagar meiota de cachaça, no seu restaurante só queria gente de bem, gente chique. Mesmo que qualquer papudinho tivesse dinheiro ela não deixava entrar. E os pinguços que estavam matando um litro de Pitu com gomos de laranja arrocharam o grito:

--- Cachorra louca, cachorra louca, deixa Zé veneno em paz, só quer bater em veneno porque ele não pode se defender.

Dona Doralice partiu para a briga, Lindinha vinha atrás com um machado, correu pinguço até para casa do diabo, Dona Doralice ficou bradando, procurando briga, Lindinha do seu lado com o machado na mão, da porta do bar Seu Chiquinho enxugando as mãos no avental, tinha terminado de lavar os pratos e as panelas naquela hora.

Os pinguços ficaram todos amoitados nas esquinas, tinha uns no beco do mijo, outros no Beco de Galego Caju norte, mais alguns na esquina de Zé Sobrinho, três dentro do Mercado Público, e uns quatro escondidos no bar do cu, gritavam:

--- Cachorra louca mande suvela tomar conta do bar do bucetão.

--- Suvela e a puta que lhe pariu, bucetão e a tabaca de sua mãe. Agora se vocês forem homens, venha brigar comigo, venham bando de caba sem veigonha, venham pro campo da honra, venham ver como uma mulher Paraibana briga, você lá são homens, vocês são uns frouxos, só dizem as coisas de longe, são uns bandos de caba de péia, cheguem se acabar comigo na ponta da faca, venham safados, venham, cheguem brigar, eu quero rasgar o bucho de vocês de peixeira Paraibana.

Os pinguços saíram para a briga com as mãos cheias de pedras, Chambão comandava a turma, ordenou:

--- Mete pedra pra cima dela, essa cachorra louca chegou aqui puxando uma cachorrinha, hoje quer mandar em tudo, joga pedra negada.

Os pinguços meteram a pedra e caco de telha pra cima de Dona Doralice e de Lindinha, chega zunia no ar, elas saíram correndo que o pé batia na bunda, trancaram-se dentro do bar, e os pinguços na frente, com pau pedra e cacete nas mãos para brigar com a cachorra louca.

Nessas alturas as calçadas estavam cheias, o quadro do mercado ficou repleto, o povo ria e davam vaias na dona do Bar, Restaurante e Lanchonete São Severino dos Ramos. O Delegado de polícia chegou, foi falar com Dona Doralice no seu estabelecimento. Convocou a todos para irem no outro dia ao Quartel da Polícia. Os Pinguços e a comerciante estavam intimados.

Dona Doralice depois do tumulto passou mal, deram lhe água com açúcar, passaram álcool nos pés e nos pulsos, nada de Dona Doralice tornar, a notícia chegou até os pinguços que a mulher estava desmaiada de raiva, e ainda não tinha dado conta de si, Chagas Chambão, pinguço velho bargado, feito na safadeza da vida, gritou bem alto que ecoou nos quatro cantos do quadro do mercado:

--- Mete uma dedada no cu dela que num instante ela torna!

Lindinha escutou, pegou uma foice e correu para a cobertura para brigar com os biriteiros, espalhou biriteiros pra tudo quanto é lado, tinha mais de trinta, entravam nos becos do centro da cidade que pareciam ratos se escondendo, e Lindinha com a foice na mão gritava:

--- Apareça bando de cachorro, venham brigar, vocês pensam o que, que podem apelidar o povo e ficar por isso mesmo, aqui vocês encontram o chapéu da viagem, na minha família num tem gente frouxa não, sendo pra brigar qualquer hora é hora.

E a vaia ecoava no centro da cidade, como não apareceu ninguém para brigar, Lindinha foi para casa cuidar da mãe.

Chambão de longe ainda gritou:

--- A carne que suvela tem na bunda não dá para fazer um pastel!

Lindinha se virou, e respondeu:

--- Mais tenho coragem de lhe cortar de foice, encoste aqui, encoste!

Lindinha entrou no bar apressada, estava muito preocupada com a saúde da mãe, pois a mesma tinha pressão alta, não podia ter contrariedade.

Mandaram chamar Zé de mãe no seu táxi, quando Zé de mãe estacionou o carro que colocaram Dona Doralice dentro, o bujão do carro secou, tiraram o bujão de gás do fogão do restaurante, colocaram no carro de Zé de mãe, que rapidamente chegou no Hospital Governador José Varela.

Dr. Hélio Carneiro estava de plantão, a encaminhou para enfermaria, consultou, mandou aplicar um soro, deixaria Dona Doralice em observação, ela estava muito estressada, disse a Lindinha.

--- Lindinha deixe Dona Doralice de Repouso, daqui para de noite eu mando ela para casa. Mas me diga uma coisa Lindinha, o que foi que aconteceu com ela?

--- Doutor Hélio é os danados dos pinguços que não deixam nós em paz, vivem apelidando eu e mamãe, e papai também,

--- Chamam vocês de que?

--- Num digo não senhor, é muito feio.

--- O que é isso Lindinha, diga!

--- Num digo.

Pirrita um pinguço que se recuperava em cima de uma cama todo se tremendo, tomando soro escutava toda a conversa, era um pinguço muito do metido, adiantou tudo para Doutor Hélio.

--- Sabe como é os apelidos, Doutor Hélio? Dona Doralice é Cachorra louca, Lindinha é suvela, e Seu Chiquinho é Chico corninho, e o bar dela se chama Bar do Bucetão.

--- Você é muito amostrado num é pirrita, quem mandou você se meter na conversa, ninguém lhe chamou aqui, se meta com sua vida, vá cuidar de você que está aí todo largando os pedaços, e deixe a vida dos outros.

Dona Doralice, já tinha tornado, quando viu pirrita dizendo os apelidos, levantou-se com o soro pendurado no braço, infincou a mãozada no pé do ouvido de pirrita, chega estalou, o desgraçado caiu no canto da parede estatelado, todo enrolado com a mangueira do soro que estava no braço, até o suporte de ferro onde fica a garrafa de soro, foi junto, Dona Doralice caiu em cima de pirrita, dando tapas, bofetes e murros, Doutor Hélio ficou de banda, Antonio de Aristides tirou Dona Doralice de cima de pirrita, e Doutor Hélio puxou pirrita para outra enfermaria. O pobre do pirrita já estava coitado, todo largando o couro, os lábios rachados, os olhos fundos, os pés inchados, não se agüentava nem ficar em pé, e Doutor Hélio lhe dizia:

--- Pirrita tu não está agüentando nem um sopro, fica provocando a cachorra louca, taí o que aconteceu, apanhasse que só a porra. Fique quieto, não se meta onde não é chamado.

Na outra enfermaria três auxiliares de enfermagens, tentavam segurar Dona Doralice, que estava procurando briga, dava pontapés, dizia palavrões, queria de qualquer maneira dar umas porradas em Pirrita. Lindinha tentava segurar a mãe, mais a velha não tinha acordo queria briga, estava com o cão nos couros. Na outra enfermaria Pirrita desdenhava de Dona Doralice.

--- Eu tenho ódio eterno dessa nojenta. O senhor num sabe como essa peste é ruim, aqui em Pedro Avelino só encosta quem não presta, num ver esse troço aonde veio parar. Isso é mais ruim do que carne de cu de tetéu, nem cozinha nem toma sal.

--- Tu num pode dizer nada Pirrita, você é de Lajes. – disse Doutor Hélio.

--- Mas eu sou um cara maneiro Doutor Hélio, sou de paz e amor, essa velha só pensa em briga.

--- Pirrita eu já te disse, fica na tua. Você nunca ganhou uma briga em Pedro Avelino, só faz perder, com esse seu físico de grilo. Se eu fosse você não mexia com ninguém.

--- No dia que eu te pegar de jeito, pirrita fela-da-puta, eu vou arrancar tuas tripas pelo cu, do mesmo jeito que eu faço com galinha, tu vai ver bichinho, tu vai ver. – gritava Dona Doralice.

Dr. Hélio mandou a ambulância deixar Dona Doralice em casa, o seu estabelecimento estava fechado, só funcionava com a presença dela, era a cabeça da administração.

Dona Doralice chegou em casa ficou repousando, tomando os remédios em casa, tomou caldo de galinha caipira, comeu batata doce com carne de carneiro assada, e água de coco.

No outro dia às nove horas da manhã, Dona Doralice encaminhou-se para delegacia de polícia, juntamente com Lindinha e Seu Chiquinho, na frente da delegacia estava mais de quarenta pinguços, vieram de todos os bairros, até Pirrita que tinha recebido alta estava presente com a roupa do Hospital, e as letras no peito APAMI. O delegado mandou todos entrarem no recinto, e falou:

--- Eu sei que essa briga de vocês é antiga. Vamos fazer o máximo possível para essa confusão não acontecer mais, a cidade fica agitada, é uma esculhambação danada, é vaia para um lado, é pornografia para outro, as famílias passando, fica vendo umas cenas terríveis, quem chega de fora fica ignorando a má educação de vocês, qual é impressão que levam da nossa cidade.

--- É o seguinte Seu delegado, eu vivo no meu estabelecimento comercial trabalhando, de dia e de noite, não sou de rua, se ninguém mexer comigo, se ninguém me acanaiá, vivo na paz, agora mexendo comigo o cão se solta. Então o senhor avisa a eles para me deixarem em paz, acabar essa estória de apelidar agente lá de casa, que tudo volta a ser normal.

--- E vocês? – O delegado perguntou aos biriteiros.

--- Nós somos da paz e do amor seu delegado, com a gente não tem problemas.

--- De hoje em diante, se eu pegar qualquer briga entre vocês, meto todos na cadeia, combinado?

Todos saíram da delegacia direto para o quadro do mercado. Dona Doralice foi trabalhar no bar, os pinguços ficaram na cobertura, angariando meiotas de cachaça.

As a rixas continuavam, as duas turmas se detestando, Dona Doralice e sua família e os pinguços existentes em Pedro Avelino. Só que no bar de Dona Doralice baixava os melhores fregueses de toda região, o tempero era exaltado, O tucunaré amuquiado no leite do coco se comia rezando, pedindo Deus perdão pelo pecado da gula, a buchada de bode, com mocotó enroladinho, era o prato preferido de quase todos os fregueses de Dona Doralice. Os pinguços debaixo da cobertura destratavam os proprietários do bar com apelidos e palavrões cabeludos. Dona Doralice não vendia tira gosta a eles, eles eram loucos para provar o tira gosto da cachorra louca, mas ela não dava esse gosto aos pinguços. Nem os pinguços manando comprar tira gosto por outras pessoas, ela não vendia, dizia:

--- Eles vão morrer com o gosto dentro, mais da minha comida eles não provam.

Dr. Hélio adentrou o bar de Dona Doralice, tomaria uma cerveja bem gelada, com costela de porco assada na brasa, farofa d’água com cebola da roxa e arroz de leite. Quando Dona Doralice avistou o médico fez uma festa, trouxe rapidamente a cerveja, e Doutor Hélio puxou conversa:

--- Como vai a saúde Dona Doralice?

--- Estou sem probrema, os cachaceiros ficam na dele e eu na minha, só ficam de longe apelidando o meu pessoal, mais eu num ligo não. Só tem uma coisa, ninguém pisa em riba de Doralice.

--- Muito bem Dona Doralice, a senhora não pode se aborrecer, senão tem um treco, ai é pior.

--- Pode deixar comigo, eu sei me cuidar, eu sou Doralice, mué da Paraíba, que nunca morreu e não tem medo de quem morre.

Dr. Hélio terminou, foi se despedir da proprietária do bar, lhe fez uma encomenda:

--- Dona Doralice, depois de amanhã vou trazer uns amigos meus para almoçar aqui, quero que a senhora prepare um bode torrado, daqueles que a senhora fez no programa de Ana Maria Braga na Globo, está certo?

--- Tá Doutor, só quero saber uma coisa, no meio desse povo que o senhor vai trazer tem pinguço misturado?

--- Não Dona Doralice, vem eu, Dr. José Martins que é louco por bode torrado, desde os tempos que morava em Angicos, Arnaldinho, Luiz Paulo Gerente do Banco do Brasil de Afonso Bezerra, Nilberto que também é Gerente do Banco do Brasil, e um pessoal do Hospital que trabalha comigo. Sim eu também vou trazer o mago Eimar.

--- Por favor, Doutor não traga pinguço, que é o bicho que eu mais detesto na minha vida.

--- Não se preocupe Dona Doralice.

--- Sabe o que é Doutor Hélio, esse tal de Eimar não faz parte da patota dos pinguços dessa terra desgraçada.

--- Não, o mago Eimar já foi pinguço, o motor dele não agüenta mais álcool, está aposentado, Eimar agora só pega no empurrão.

Dr. Hélio convidou os amigos para comer o torrado de bode, de Dona Doralice puxado á cerveja. Tudo acertado o encontro seria num sábado dia de feira em Pedro Avelino, dia de maior movimento na cidade. Naquela data também aconteceria a vaquejada anual da cidade.

A cidade fervilhava de vaqueiros, visitantes, Pedroavelinenses que moravam fora, a cidade estava muito festiva, coisa que só acontecia de ano em ano. O Bar Restaurante e Lanchonete São Severino dos Ramos estava superlotado, no canto da parede estava uma mesa reservada para os amigos de Doutor Hélio Carneiro, a mesa estava forrada com uma toalha com ramagens verdes e pretas, em cima um jarro com flores de plástico de todas as cores, copos emborcados numa bandeja de alumínio, ninguém podia encostar-se à mesa que Dona Doralice gritava logo, -“Epa, nessa aí não, está é de Doutor Hélio e os amigos dele”. No bar o cardápio era o mais convidativo possível, costela de porco assado na brasa, farofa de cebola roxa, tucunaré a escabeche, ova de curimatã ao leite de coco, picado de porco, sarabulho de porco, panelada de gado com tripa enroladinha, galinha caipira a cabidela, cabeça de galo com ovo caipira para tirar ressaca, caldo de mocotó e pirão graxento, miolo de boi com pimenta do reino e alho frito com banha de porco, para sobremesa, rapadura do cariri, doces: de leite, caju, mamão verde com coco, chouriço de sangue de porco com banha coberto com gergelim e pedaços de castanha de caju. Tudo preparado, para receberem mais e mais fregueses que chegavam na cidade. Precisamente ao meio o dia chegou Doutor Hélio Carneiro e sua turma de amigos para fazerem a festa nos quitutes de Dona Doralice. Dr. Hélio apresentou os amigos para dona do bar, inclusive para Lindinha, mais conhecida como Suvela, só faltou seu Chiquinho, que estava na cozinha lavando pratos, panelas e talheres.

Dr. Hélio perguntou logo a Dona Doralice:

--- Onde está Seu Chiquinho?

--- Tá lá dentro lavando os troços da cozinha, o senhor quer falar com ele?

--- Se for possível.

Dona Doralice toda espevitada, com seu jeitão de mulher despachada meteu o grito pra cima:

--- Ó Chiquinho, Chiquinho ó Chiquinho, venha cá meu véio, Doutor Hélio quer falar com você.

Seu Chiquinho apareceu no salão do bar, enxugando as mãos no avental branco, com bordas vermelhas, todo molhado, com uma toca branca na cabeça, suado que fazia dó. Dirigiu-se a mesa de Doutor Hélio, que o apresentou aos amigos, Dona Doralice satisfeita pela atenção que o médico dava a ela e a sua família, não se continha de felicidade. Pediram uma cerveja gelada e um prato de bode torrado com arroz e farofa. A dona do bar saiu apressada para pegar o que foi pedido, Doutor Hélio deu a ficha da família para os amigos:

--- Aqui se chama Bar do bucetão, Seu Chiquinho tem apelido de Chico corninho, essa coisa feia que ela chama de Lindinha, é filha dela, os biriteiros daqui colocaram lhe o apelido de suvela e Dona Doralice é chamada popularmente de Cachorra louca, por favor, nenhum de vocês mencione esses apelidos por aqui, senão vamos ser expulso do ambiente, Dona Doralice é braba como uma cobra caninana.

--- Mas por quê bar do bucetão – perguntou Luiz Paulo.

--- Você ainda não prestou atenção na vagina de Dona Doralice como é grande, ela só usa bermudas rachando a talhada da vagina bem no meio.

Todos componentes da mesa deram risadas de uma vez só. Dona Doralice vinha chegando e perguntou:

--- De que estão rindo?

--- É as piadas de Doutor Hélio que é muito interessante. – respondeu Luiz Paulo.

Os amigos do medico começaram a saborear a cerveja, que estava geladinha de tinir. Quando de repente chegou Dona Doralice e Lindinha com varias iguarias para serem devoradas pelos presentes na mesa. Bode torrado, carne assada com macaxeira, batata doce com lingüiça feita em Caicó, e ova de curimatã preparada no leite do coco, essas ovas foram trazidas por Fernando diretamente da lagoa do Piató, encomendada por Dona Doralice, para fazer especialmente para o medico amigo.

Os amigos do Doutor se empapuçavam com comida da cachorra louca, Luiz Paulo comia o que vinha para mesa, parecia que estava ali pela ultima vez. Nilberto fazia sua despedia da gerencia do Banco do Brasil de Pedro Avelino, e o restante da turma de cabeça baixa, comendo, ninguém conversava.

--- Querem mais alguma coisa? As panelas lá dentro estão esborrotando de comida. Aqui quem chega pra comer só sai com o rabo cheio.

Luiz Paulo com a boca cheia, perguntou a dona do Restaurante:

--- Ainda tem ova de curimatã?

--- Tem meu fio, aqui você sai com o cu sangrando.

--- Traga mais um prato de ova, de curimatã, que eu hoje me lasco de comer, e também traga uma cerveja bem geladinha.

E lá vem Dona Doralice com mais uma bandejada de comer, os amigos de Doutor Hélio traçando tudo que aparecia, pareciam que estavam desenganados do mundo, que aquela seriam as últimas vezes que veriam comidas. Quando estavam todos fartos de comer, só bebericavam a cerveja. Dona Doralice puxou uma cadeira e foi conversar, com os novos amigos.

--- Todos satisfeitos, todos de rabo cheio?

--- Claro Dona Doralice, eu nunca pensei que ia comer tanto na minha vida, a senhora deve ter feito algum curso de culinária, por que o seu tempero é ótimo.

--- Né tudo isso que o senhor está dizendo, agora que cozinho bem, isso é fato.

--- Dona Doralice a senhora devia abrir uma continha no banco, aqui do lado, tudo que a senhora apurasse no dia, depositava, o seu dinheiro ficando no banco, está seguro.

--- Como é o nome do senhor mesmo?

--- Luiz Paulo!

--- Veja bem seu Luiz Paulo, o Banco do Brasil é um ladrão, lá tem tanta taxa pra gente pagar, que no final do mês o que eles cobram é um dia de trabaio meu, sou besta não, o meu dinheiro é muito bem guardado. Não tem homem do mundo que descubra onde eu escondo, dinheiro meu não é pra ir pra banco não senhor, quando eu quero uma coisa eu compro a vista, quando eu preciso de dinheiro, num é preciso entrar em fila duma máquina cheia de botão, de números, que tem um negócio de senha, de letras, de está fora do ar, que não tem dinheiro, quando eu quero meu dinheiro ele está ali na hora, na minha frente me esperando, banco é muito difícil de se lutar, banco é pra quem tem muito estudo e paciência, Banco não foi inventado para analfabeto, foi feito para quem estudou muito, e eu só sei carimbar o meu nome com o dedo.

--- Também não é assim como o povo fala, a senhora tem mais segurança com seu dinheiro, pode fazer um investimento para melhorar o seu comércio, o banco lhe ajuda, e senhora ajuda ao banco.

--- Quero não, quero não, eu é que sei como os velhos vivem tudo lascado na porra desse banco. Seu Luiz Paulo tem velho passando fome, danaram empréstimo no rabo dos aposentados, também tem um tal de limite, eles tão tudo reiadinho da silva, com uma mão no feixo e outra no cano, eu só entro no banco para receber a aposentadura de Chiquinho, e mais nada.

Luiz Paulo vendo que não ganhava para Dona Doralice mudou logo de assunto, passou conversar para matar o tempo:

--- A senhora tem telefone aqui?

--- Tenho sim senhor. Mais foi a coisa que eu mais me arrependi na minha vida, aqui em casa ninguém tem sossego, eu vou mandar cortar essa linha de telefone, foi a maior desgraça que já inventaram.

--- Por quê Dona Doralice.

--- No começo, quando todo mundo queria um telefone, eu metida a besta, também pedi uma linha. O telefone chegou, ficava eu, Lindinha e Chiquinho todos na sala sentados esperando o danado chamar, e ninguém chamava, ás vezes nós ia dormir mais de onze horas da noite esperando que o bicho tocasse, ninguém ligava pra gente. Então eu botei o anúncio na raida daqui, que o nosso bar já tinha telefone. Meu senhor, não tivemos mais sossego, quando anunciaram na raida a primeira vez, o bicho disparou, trim, trim. Correu eu, Lindinha e Chiquinho para atender, tudo de uma vez só, quem pegou primeiro o telefone foi eu, ai o caba sem vergonha do outro lado da linha disse:

--- Alô, aqui é da telemar, ai de onde é?

--- É do Bar e Lanchonete São Severino Dos Ramos, de propriedade de Doralice Bezerra. – Ai o caba disse:

--- Dona Doralice, estamos fazendo um teste nas linhas telefônicas, o que eu mandar a senhora fazer, a senhora faça, tá Ok?

--- Tá bom – respondi.

--- Dona Doralice, no seu telefone tem um fio que parece uma molinha, num tem?

--- Tem!

--- Então a senhora estica o fio até num poder mais, tá certo.

--- Tá...

--- Esticou Dona Doralice?

--- Estiquei...

--- Está bem esticadinho Dona Doralice?

--- Está, chega está teso, o que faço agora?

--- Soque no cu.

--- Seu Luiz Paulo eu disse tanto do desaforo a esse safado, que fiquei rouca. Como é que uma mulher de respeito como eu, os safados ficam fazendo mangonça da minha cara. Desde esse dia eu tomei ódio eterno de telefone, atendo porque é o jeito.

--- Dona Doralice, em todos os locais é desse jeito, o nome disso que fizeram com a senhora é trote, não esquente com isso, vá levando sua vida do jeito que Deus manda. Eles só fazem isso porque sabem que a senhora vai ficar com raiva.

--- Num dá não para agüentar não seu Luiz Paulo, num dá não.

--- Dona Doralice esse é o pagamento que nós recebemos do mundo moderno, na minha casa é a mesma coisa, todos nós temos que conviver com a globalização.

--- O que danado e isso?

--- É muito difícil para eu explicar á senhora neste momento, deixe para outro dia.

Só que Dona Doralice não parou a conversa sobre o telefone, dizia ela que era a pior coisa que inventaram no mundo.

--- Sim, outro dia o danado do telefone, tocou novamente, fui atender, quando eu disse alô, a mulher do outro lado não deixou nem eu me identificar, foi logo dizendo – aqui é do cartão Credi-ouro, o melhor cartão que a senhora pode ter em seu poder, não tem anuidade, os nossos juros são os menores possíveis, a senhora ainda concorre, uma viagem para Fernando de Noronha, um carro zerinho para colocar na sua garagem. Eu disse: moça deixe eu falar, a danada não deixava, e continuava a ladainha, - a senhora foi sorteada pelos nossos computadores, como uma pessoa privilegiada, como uma das pessoas de mais sorte em Pedro Avelino, com o nosso cartão, Credi-ouro a senhora pode comprar em supermercados, farmácias, lojas de móveis e eletrodomésticos, com o nosso cartão a senhora não precisa portar dinheiro, pode sacar em qualquer terminal eletrônico vinte e quatro horas, sua vida vai melhorar divinamente, como à senhora nunca esperou, não desperdice essa oportunidade que é única na sua vida. – minha fia deixe eu falar, - não se preocupe que o nosso cartão faz tudo para a senhora, basta só fornecer o seu CPF, o RG, endereço e data de nascimento que dentro de 48 horas o cartão chega em sua casa, vamos fazer o seu cartão agora. Sabe o que eu fiz seu Luiz Paulo?

--- Não!

--- Disse, vá pra uma porra, e bati o telefone na cara dela, num deixa agente falar, quer falar sozinha, que fique falando só.

--- É assim mesmo, a senhora tem que se acostumar.

--- Acostumo não, isso é coisa de mim mesmo, não acostumo com o que não presta. Eu tenho tanto abuso de telefone, que o senhor não avalia, eu só ainda tenho esse danado aqui, por causa dos pedidos que o povo faz senão eu já tinha entregado.

--- Mas a senhora precisa dele Dona Doralice, o telefone é muito útil para o seu movimento, tire isso de letra, não se stresse com isso, bom é a vida.

--- Outra vez, foi uma casa funerária que ligou para mim oferecendo um tal Kite de enterro, e eu ficava pagando por mês. Bati o telefone na cara. E o que é Kite Seu Luiz Paulo?

--- É o caixão, as flores, a mortalha, os castiçais, as velas o carro para levar para o cemitério, e outras coisas mais.

--- Há se eu soubesse que Kite era isso, tinha mandado eles oferecerem a mãe deles.

Dona Doralice não parava de falar, quando Doutor Hélio Carneiro entrou na conversa, pediu para Dona Doralice contar a de Lindinha.

--- A de Lindinha foi o seguinte: sabe o que é seu Luiz Paulo, Lindinha é louca para arranjar um namorado, a bichinha tem tanta vontade de arranjar um namorado, ela vive telefonando para mãe Dinhá, para saber o futuro dela, mais mãe Dinhá vive enganando a bichinha, disse que vai aparecer para ela um homem bonito, que vai fazer eu e ela muito feliz, esse homem nunca aparece, as contas do telefone são enormes, eu proibi Lindinha de telefonar, esse homem nunca aparece. Eu acho que mãe Dinhá diz que eu vou ficar feliz, porque deve ser um bom rapaz.

--- Não perca a fé, Dona Doralice, que esse rapaz um dia aparece, tudo vai ficar bem para sua família.

--- Oi seu Luiz Paulo, eu só trabaio pensando em Lindinha, ela agora me pediu três coisas, e eu vou fazer pra ela, a primeira e mandar botar aqueles ferros nos dentes, Lindinha é doida por aqueles grampos, sendo coisa da moda Lindinha quer.

--- Dona Doralice, aquilo é para fazer correção dos dentes, não é moda não.

--- É moda sim, todo mundo usa, tem gente que nem tem os dentes entramelados, são bem linheirinho e usa, Lindinha quer com as burrachinhas pretas e vermeias, Lindinha e framengo doente, e a segunda coisa é aquele pinguelinho que as moças botam no imbigo, Lindinha adora, e a terceira é um telefone celular pendurado nos cóis, tudo isso eu vou fazer para Lindinha de uma vez só. Eu vi dizer que no bairro de Igapó vende aqueles grampos de ferro de segunda mão, vou bater lá para Lindinha botar os dela, em cima e em baixo.

--- Dona Doralice o nome desse pinguelinho que a senhora disse, é piercen, não diga pinguelinho, fica muito feio para uma senhora decente como você.

--- E tudo que fica pendurado Seu Luiz Paulo, é pinguelo!

--- Nem tudo Dona Doralice, nem tudo.

--- Agora Seu Luiz Paulo, o que Lindinha tem mais vontade de ser, é atriz, essas muiés que faz novela, senhor sabe, num sabe?

--- Sei!

--- E tem mais uma coisa, ela se acha a cara de uma atriz que passa na televisão, cuma é meu Deus o nome, cuma é o nome da artista. Estou caçando na cabeça o nome da muié. Já sei, é Déborah Secco, é isso. E tem outra coisa ela não perde um capítulo da maiação, ela disse se pudesse começava pela maiação.

--- Chame Lindinha que eu quero conhecer.

--- Lindinha vem cá, o home aqui quer te conhecer.

De dentro da cozinha saiu Lindinha, mais conhecida como suvela. Vestida num short curto, entrando nas virilhas, com uma camiseta de política, com uma toca branca na cabeça, a nariz muito fino, a cara chupada, parecia uma vara vestida.

--- Pronto seu Luiz Paulo, minha fia num é linda?

--- É, a senhora tem razão, ela tem tudo para ser uma atriz, só é estudar. Pode ser que futuramente pose até para uma revista masculina.

--- Qual revista? Aquela que as muiés ficam com o tabaco de fora? Deus me livre, minha fia nunca vai fazer isso, nós tem vergonha.

O movimento no restaurante de Dona Doralice era enorme, era dia de feira e ainda por cima também estava acontecendo á vaquejada da cidade.

Dona Doralice colocou mais gente para trabalhar, as mesas estavam cheias de gente bebendo e almoçando, a fama do tempero da paraibana foi longe. Quando de repente chega Lindinha e diz alguma coisa no ouvido de Dona Doralice, ela sai apressada e vai lá dentro, e volta rapidamente, com a cara vermelha, bufando de raiva, e gritava:

--- Eu só queria saber quem foi o fela-da-puta que fez aquelas patifarias nos banheiros, eu me acabava com ele na peixeira agora mesmo, isso foi mandado pelos pinguços, pois um homem de vergonha não faz umas coisas daquelas, só um caba safado se presta para fazer uma coisa feia dessa.

--- O que foi Dona Doralice? -perguntou Luiz Paulo.

--- O que foi? Desenharam uma buceta no banheiro dos homens e uma rola e um par de cunhão no banheiro das muiés, eu só queria saber quem foi esse caba safado. Eu estou lambendo uma rapadura para saber quem foi.

O pessoal que estavam bebendo e fazendo refeições, ficaram espantados com o linguajar da dona do restaurante.

--- E vou dizer mais, vou trancar as portas só sai daqui de dentro quando eu descobrir quem fez a patifaria, vou mandar chamar a polícia.

--- Foi você que fez isso Luiz Paulo? – perguntou Nilberto.

--- Você é doido, eu vou lá querer encrenca com uma cobra dessa.

Dona Doralice fechou as portas, mandou chamar a polícia para tomar as providências cabíveis para quem fez os desenhos que apareceu nos seus sanitários. Seu Chiquinho saiu enxugando as mãos no avental bordado, perguntou:

--- O que é isso que você fez Doralice, trancou o povo aqui dentro, estão todos morrendo de calor, você não sabe quem foi deixe isso de mão, não arranje mais confusão.

--- Chiquinho tu cala tua boca, quem manda nessa porra aqui sou eu, não venha dá pitaco onde não é chamado, vá pra cozinha lavar os pratos que é muito melhor pra você.

Seu Chiquinho saiu, esfregando as mãos, não tinha voz altiva para mulher, é um pobre dominado pelas brutalidades da esposa.

Bateram na porta, Dona Doralice foi abrir era o Delegado, que logo perguntou:

--- Por quê estão todos trancados?

--- Foi eu que tranquei, pra não correr ninguém.

--- E o que foi que houve Dona Doralice?

--- Desenharam umas putarias nos banheiros, eu quero saber quem é o responsável, por isso tranquei todos aqui no salão.

--- E que desenhos são esses Dona Doralice?

--- No banheiro dos homens desenharam uma buceta bem grande, no das mulheres, uma pica bem grande com umas asas, o nome daquilo e caraio de asa, e também botaram uns cunhão bem grandão.

--- Dona Doralice, como é que a senhora faz um constrangimento desse com os seus clientes, o pessoal chega no seu comércio para gastar dinheiro, querem ser bem tratados, e a senhora faz um absurdo dessa natureza. Olhe para as pessoas que estão aqui, só tem gente descente, gente de respeito. A senhora me tira dos meus afazeres para resolver uma bobagem dessa, em todo banheiro de botecos tem esses desenhos, nunca vi tanta besteira como essa da senhora. Mande uma pessoa limpar as paredes, dê isso por acabado, e tudo bem.

--- Não senhor Delegado, eu quero que o senhor reviste todos, encontre o lápis que fizeram o desenho.

--- Dona Doralice, eu já ando perdendo a paciência com a senhora, por qualquer coisinha, a senhora bate no quartel para dá queixa de alguém. É porque chamam á senhora de cachorra louca, porque chamam sua filha de suvela, porque chamam seu marido de Chico corninho, é por alguma brincadeira que dizem. A senhora não é a dona da verdade, a senhora não pode pegar na boca do povo, a senhora está se tornando muito chata.

--- Até o senhor está dizendo essas besteiras com agente daqui de casa, o senhor sabe que eu detesto esses apelidos, por favor, pare.

--- Bem, eu vou embora, e não mande mais me chamar por qualquer besteira, eu tenho muito que fazer.

--- Essa não delegado, não me venha com essa estória, de deixar tudo pra lá, cumpra com o seu serviço, reviste o pessoal até achar o lapi que fizeram aquilo.

--- Sabe o que eu vou fazer, Dona Doralice, eu vou prender á senhora. Teje presa! vamos para o quartel.

Dona Doralice, quando recebeu voz de prisão desmaiou, caiu de pernas abertas, toda se tremendo, rolando pelo chão virando mesa, Lindinha chorava agarrada com a mãe, foram buscar água com açúcar para Dona Doralice tomar. Do lado de fora os pinguços vaiavam a dona do restaurante, o delegado mandou todos se retirarem, e disse:

--- Eu não vou prender á senhora, mais de outra vez eu não vou ter mais consideração.

Dona Doralice estava de olhos fechados, quando o delegado saiu, ela abriu um olho, se levantou, foi pra cozinha, todos os clientes que estavam no restaurante foram embora do Bar e lanchonete São Severino dos Ramos, mais conhecido com bar do Bucetão,

Na cozinha Seu Chiquinho reclamava de Dona Doralice do escarcéu que ela fez naquele dia, espantou todos os fregueses, era um dia de festa na cidade, e o bar fechado deixariam de ganhar dinheiro, pela besteira que ela fez.

--- Comigo é assim, caba que não presta não entra no meu estabelecimento, você não está vendo, que não agüento desenharem putaria nos meus banheiros, pode ser Doutor, pode ser gerente de banco, pode ser a porra, comigo é assim, podia ser a minha amiga Ana Maria Braga, eu botava pra fora.

--- Você tem que ter mais paciência Doralice, é desse povo que nos ganhamos o dinheiro, sem eles como é que vamos nos sustentar?

--- Vá pra porra Chiquinho, vá se lascar pra lá. Seu lugar é na cozinha.

O velho Chiquinho saiu desconfiado em procura da cozinha, Lindinha assistia televisão, e Doralice feita uma cobra, estava com raiva do delegado, ele tinha que corrigir aquele povo todo, para saber quem tinha a caneta que desenhou aquelas coisas feias nos banheiros.

No domingo ás nove horas Dona Doralice abriu o Bar, Restaurante e Lanchonete São Severino dos Ramos. Ainda estava angustiada do dia anterior, da raiva que teve, ia ver se controlava mais os nervos, estava muito nervosa, dizia Doutor Hélio, que era stresse por ela trabalhar demais, mas ela achava que não, quem acabava com ela era os canaia da cidade, que queria derribar ela.

Entraram no estabelecimento, Doutor João Adauto, José Wilson, os dois filhos, Alexandre e Henrique:

--- Dona Doralice tem uma cervejinha gelada?

--- Tem Doutor João! Não quer comer nada?

--- Prepare uma galinha cabidela, mais o que estiver pronto traga.

A dona do bar saiu, apressada com a bermuda de malha apertada, entrou na cozinha para providenciar um tira gosto para os clientes, Doutor João Adauto, vendo a bermuda de Dona Doralice, falou:

--- A vagina de Dona Doralice está tão apertada que está rachando no meio.

--- Ontem houve um maior cu de burro aqui. – disse Zé Wilson.

--- Por quê?

--- Parece que desenharam umas sacanagens nos banheiros.

Doralice vinha com a bandeja na mão com a cerveja e o tira gosto colocou na mesa: perguntou:

--- Mais alguma coisa Doutor João?

--- Não Dona Doralice?

--- Qualquer coisa pode chamar.

--- Sim Dona doralice, o que foi que aconteceu ontem aqui?

--- Não me toque nesse assunto Doutor João, ainda hoje eu estou por aqui. (passou a mão na garganta).

--- Mas o que foi?

--- Desenharam umas porcarias no banheiro, mas eu já tirei tudo com bom-bril.

--- Que porcarias são essas?

--- No banheiro dos homens, fizeram uma tabaca bem grande e cheia de cabelo, dizendo que era a minha. No das muié, foi uma pica bem grande, com umas asas e um par de cunhão, dizendo que era para o cu de Chiquinho.

--- Não acredito!

--- Pode acreditar Doutor João, pode acreditar.

--- Eu sei quem foi, temos uma pessoa que gosta de fazer isso nos banheiros.

--- Quem é Doutor João, quem é, me diga!

--- Isso é traquinagem de João de Armando?

--- Mas ele não teve aqui ontem!

--- Ele esteve, foi porque a senhora não viu.

--- O senhor só pode estar brincando comigo.

--- Não brinco com uma situação seria dessa Dona Doralice.

--- Deixe aquele cachorro chegar, aqui ele não vai butar nem o pé no batente, que eu corto ele de foice.

--- Muito bem Dona Doralice, a senhora está certa, aquele safado não presta, metá-lhe o cacete para ele aprender a respeitar uma família descente como a sua.

--- Ele quando chega aqui com a cara de bonzinho, me agradando, e fazendo as safadezas dele pelas minhas costas, tranquei os meus fregueses bons aqui, e mandei chamar a polícia, por causa daquele oi de gato.

Dona Doralice foi avisada que a galinha estava pronta. Saiu para pegar a galinha cabidela na cozinha,

--- João Adauto, tu parece maluco, se João de Armando entrar no bar dessa velha, ela baixa o cacete. Falou José Wilson.

--- Papai parece que é doido, brincar com uma velha maluca dessa. – complementou Henrique.

--- Será que a Cachorra louca tem coragem de dar umas porradas em João?

--- Ora se tem, só tem!

--- Vou ter que desmanchar essa estória.

A dona do bar chegou, com a galinha a cabidela, arroz, farofa e feijão verde.

--- Mas alguma coisa Doutor João?

--- Está tudo uma beleza, Dona Doralice. Sim, eu acho que não foi João de Armando que fez os desenhos, ele passou o final de semana em João Câmara.

--- Também acho, não vi ele por aqui esses dias.

Dona Doralice ficou conversando, na mesa, e em frente seu estabelecimento comercial, como ela chamava, parou dois homens numa Kombi com um alto falante em cima da Kombi vendendo sorvete:

--- Sorvete, olha o sorvete, oito bolas por um real, traga a vazia, sorvete. Olha o sorvete, oito bolas por um real, têm de doce de leite, nata, tamarina, abacate e maracujá, sorvete, traga a vazia, sorvete, traga a vazia, oito bolas por um real, sorvete.

A velha Doralice, saiu com toda raiva que sempre a acompanhava, foi para rua brigar com pessoal do sorvete:

--- Bando de fio de uma puta, deixa de zuada no meio da rua, o povo não pode nem dar um cochilo depois do almoço que vocês não deixam, vão fazer zuada na terra de vocês, deixe a terra dos outros em paz. Aqui no bar ninguém pode nem conversar com vocês com esse retetei danado, incomodando o povo, onde já se viu isso.

O pessoal da Kombi parou a propaganda do sorvete, foram embora, todos os fregueses do bar também. Dona Doralice, era desse jeito, ela mesmo procurava confusão pra cima dela. Tornou-se antipática, arrogante, o dinheiro subiu a cabeça dela, se achava rica, queria pisar em todos, escolhia as pessoas para entrarem no seu estabelecimento comercial, como dizia ela. Só comprava tudo a vista, por causa disso, humilhava os marchantes, de carne de gado e de caprinos, dizia que os marchantes de Pedro Avelino só vendiam merda, eram uns mortos de fome. Desfazia do comércio local, dizia que só prestava o comércio da Paraíba, para ela a Paraíba era tudo. Dizia:

--- Se esse povo conhecesse o comércio de Campina Grande, eles iam ver o que era comércio, não a merda dessas biroscas que tem aqui, os comerciantes de Pedro Avelino são uns mortos de fome, vou deixar de fazer as minhas compras aqui, vou pedir a Joaquim Brejeiro para trazer tudo pra mim de Bananeiras, deixei de comprar aqui de vez, não compro mais um alfinete, nessa terra afragelados.

A pinguçada de longe ficavam escutando os desaforos da cachorra louca, sem poder fazer nada, prometeram ao delegado que não causariam mais confusões com a cachorra louca. Os biriteiros encabeçados por Chagas Chambão, sentados nos bancos da cobertura, apreciavam Dona Doralice passar para comprar pão na padaria, de volta acompanhada de outra pessoa, falava alto:

--- Tá vendo minha fia, nem os pão daqui presta, são umas porcarias, parecem uma catota, eu digo isso porque não preciso de ninguém aqui, dinheiro eu tenho, não preciso desses bostas daqui.

Dona Doralice quando viu seus inimigos sentados nos bancos da cobertura da feira, puxou um bolo de dinheiro do bolso, ficou passando as notas:

--- Aqui, eu tenho: Garoupas, Onças, Micos leão dourados, Araras, Garças, Tartarugas marinha, aqui só nesse bolo em tenho três mil contos de real, fora o que eu tenho guardado num lugar secreto, agora tem pinguço, que nunca butou uma Garoupa no bolso, eu tenho num sei quantas. Tem pinguço que viu uma Garoupa na vida, na mão de Silvio Santos na Televisão, tem deles que não tem um real que é uma beija flor pra comprar uma meiota de cachaça, pinguço é bicho desgraçado, devia tudinho morrer inchado.

A turma de biriteiros, como: xola, chambão, pirrita, Beibe, Beto fininho, Chico bola, Zé veneno, pirão, Carlinhos Canela, largatão, Moacir Aureliano, Juviano, Pareia e Nininho aleijado que escutavam a pabulagem da cachorra louca, ficavam irados, mas tinham medo da Polícia.

Os biriteiros derrubaram dois litros de aguardente, com tira gosto de pão, o cheiro de comida boa vinha do restaurante São Severino dos Ramos, ficavam putos da vida por não poder nem comprar. O biriteiro Chico bola quando enchia a cara de cachaça, chorava e ria ao mesmo tempo, pegou no sono na calçada do mercado, quando acordou, foi direto para o restaurante da cachorra louca, e os pinguços chamando:

--- Chico não vá para este mosqueiro, não vá Chico!

Só que Chico quando chegou na porta do restaurante estava cheio de clientes, Chico pediu:

--- Me dê um pouquinho de comida, estou morrendo de fome. Eu fico com a boca cheia d’água só em sentir o cheiro da comida.

Dona Doralice cobriu Chico Bola no cacete, juntamente com Lindinha. O Cacete comia solto nos espinhaço, na cabeça, nas pernas do biriteiro. O pessoal que estavam no restaurante tiram Dona Doralice da confusão, Chico bola com as ventas sangrando, se ajoelhou no calçamento quente, jogou uma praga a Dona do restaurante, tinha aprendido a jogar praga com a mãe Maria bola. Chico levantou as mãos pro céu e jogou a praga:

--- Tenho fé em Deus, que pelas horas em que são, essa escrota vai ficar na miséria, vai ficar numa tira que nem Nossa Senhora mãe de Jesus vai te salvar da lástima que você vai ficar. Vamos pra frente, essas suas riquezas vai acabar, já vi torres mais alta cair, quanto mais você que não é nada.

--- Deus sabe o que está fazendo, uma muié trabaiadeira como eu ele não vai desprezar. São Severino dos Ramos é quem me protege.

Levaram Chico Bola com o nariz sangrando para o hospital. Levou seis pontos em cima do nariz. O Delegado soube do acontecido, foi até a dona do restaurante:

--- Dona Doralice, eu já lhe disse, que senhora passou dos limites, a bagunça da senhora no centro da cidade hoje extrapolou todos os limites, eu vim lhe prender, teje presa!

Dona Doralice quando recebeu voz de prisão, desmaiou. Lindinha já sabia do truque da mãe, já tinha colocado uma cadeira perto dela, que caiu sentada na cadeira. Foram buscar água com açúcar, deram a cachorra louca, nada dela tornar, colocaram amoníaco no nariz, ela tornou. O delegado colocou Dona Doralice dentro do carro da polícia e levou para o quartel. O delegado deu-lhe conselhos, e disse:

--- A senhora vai dar toda semana a feira de Chico bola.

--- Dou não, pode me prender, mas eu não dou feira pinguço.

--- A senhora é quem sabe, vamos para o xadrez.

--- Não senhor delegado, eu dou.

A comerciante foi para casa, sentindo-se humilhada por ter sido presa, por poucas horas, mas estava contrariada, se achava uma mulher de vergonha. Mas se achava com direito de fazer e acontecer na cidade.

--- Essa doida chega da Paraíba, se arruma na vida, agora quer bater nos nossos conterrâneos. Assim disse largatão.

Dona Doralice fechou o estabelecimento comercial por uma semana, foi passar oito dias em Natal, queria esquecer o acontecido, mas não estava arrependida, fazia tudo de novo.

--- Doralice você anda muito nervosa, se acalme minha velha.

--- Cale a boca Chiquinho, você não apita nada.

A família de Dona Doralice estava de manhã cedo perto da cobertura, esperava o ônibus que aos levaria até Natal. A pinguçada já tomava cachaça no bar do cu desde as quatro horas da manhã. Todos com a cara cheia de cachaça soltavam piadas, e Dona Doralice bufando de raiva. Cada biriteiro que falasse a sua graça:

--- Esses brejeiros da Paraíba vão se perder em Natal, ou morrer atropelados.

--- Mais num vou lisa, tenho dinheiro pra gastar, num vivo pedindo dinheiro a quem passa pra encher o rabo de cachaça.

O ônibus passou, embarcaram para capital, iam descansar uns dias das tarefas do comércio, e das brigas com os biriteiros. Com oito dias justinhos, Dona Doralice entrou na cidade de Pedro Avelino num carro novo, comprado a vista. Lindinha vinha com piercen no umbigo, os dentes cheios de ferro com borrachinhas pretas e vermelhas e um celular no cóis da bermuda. A comerciante vinha com os dentes arreganhado, rindo para todos da cidade, parou na frente do comércio, parou e entrou no bar, o motorista que trouxe carro dirigindo, foi João de Armando, que também se comprometeu a ensinar a Lindinha a dirigir. O comércio foi aberto, o movimento era o mesmo, com toda a má criação da dona do bar, mais o pessoal gostava do tempero da comida da dona.

Lindinha aprendeu rápido a dirigir o FIAT UNO 98, de cor vinho, não parava na frente do bar, Lindinha era dentro do carro para todos os lugares, comprar pão na padaria, Lindinha ia de carro, comprar um quilo de açúcar, lá estava Lindinha dentro do carro, quando ela passava nas quatro bocas, a vaia ecoava nos quatros cantos do centro da cidade, por onde ela passava, a vaia comia solta. Virou galhofa na rua, Lindinha dirigindo o carro. A convivência da família de Dona Doralice estava insustentável com população de Pedro Avelino, principalmente com os pinguços. Ela só admitia no seu estabelecimento comercial, como dizia, gente chic, gente mais ó menos, não era bem vindo para saborear os seus quitutes. E dizia:

--- O povo dessa terra tem inveja de mim, porque eu sou amiga de Ana Maria Braga, eu só tenho amizade com gente fina.

Aos troncos e barrancos Dona Doralice convivia com a população da cidade, com suas arrogâncias e imbecilidades. A falta de respeito com os mais humildes fazia com que a metade da população a detestasse, queria pisar em todos, comprava poucas coisas no comércio, tudo dela vinha da Paraíba, dizia que em Pedro Avelino não tinha nada que prestasse, os comerciantes só vendiam porcarias.

Certo dia entrou um pequeno circo na cidade, desses circos que não tem nada, nem a cobertura tinha, só o pano de roda, e uns poleiros de tábuas velhas. Na frente vinha um opala caindo os pedaços, a ferrugem comendo os para lamas, com um alto falante no teto anunciando suas atrações:

--- Venham todos ver o Gran Circo Panamericano, que será armado por trás da Prefeitura, a sua grande atração, é o índio Aritana, índio esse vindo diretamente do Xingu, que fará atrações sensacionais para o grande publico dessa cidade. Ele engole fogo, faz trapézio, paradas de braço, e doma qualquer touro brabo que estiver a na região. Acompanhando o opala vinha um caminhão com a troçada do circo e seus artistas. Dirigindo o caminhão vinha á atração principal, o índio Aritana, com os cabelos loiros batendo nos ombros, com uma franja caindo nos olhos, braços musculosos e olhos verdes. Quando Lindinha viu Aritana, enlouqueceu de paixão, foi amor á primeira vista. Doralice também estava na calçada com Lindinha, foi logo dizendo:

--- O que esses passa fome vieram fazer aqui, o povo daqui não tem dinheiro nem para comer, quanto mais para ir a circo, te descunjuro bando de acanaiados. Esses nojentos não têm onde caírem morto.

--- Mamãe pare com isso, á senhora não conhece o povo do circo, como é que fica dizendo essas coisas deles.

--- Minha fia eu conheço esse povo, isso são uns miseráveis, não come bosta porque amarga.

--- Como á senhora sabe disso, já comeu?

--- Porque quem já comeu me disse, que só presta com açúcar, o povo desse circo não tem dinheiro nem pra comprar o açúcar.

--- A senhora tem umas coisas feias, não sei porque eu fico do lado da senhora nas suas confusões. Às vezes a senhora faz suas brigas sem razão nenhuma.

--- Vai ficar do lado dos infelizes?

O circo começou armar por trás da Prefeitura, por cima do muro do quintal Lindinha ficava olhando Aritana se movimentar na armação do circo. Aritana fazia de tudo, cavava buracos, levantava mastros, batia escoras, amarrava cordas, armava o trapézio. Era uma fera Aritana, sempre de sunga azul, com um corpo musculoso, e uma bandana na cabeça. Lindinha não se cansava de olhar para o índio do Xingu. A mãe de Lindinha desconfiou e foi ver o que a filha tanto fazia no quintal.

--- Lindinha o que você tanto faz nesse quintal?

--- Estou olhando armar o circo.

Dona Doralice, também olhou, verificou, viu Aritana só de sunga trabalhando. O pessoal do circo eram muito pobres mesmo, mas trabalhadores vendiam sua arte por todas as cidades do interior.

--- Bora lá pra dentro, tem muito que fazer, bora!

--- Já vou mãe.

Sandra, chamada pela mãe de Lindinha, mas os pinguços colocaram o apelido de Suvela, estava encantada com o índio Aritana, era um amor que estava dilacerando o coração, sentia uma agonia estranha dentro do seu corpo, achava que era amor.

O circo estreou num sábado á noite. Os poleiros estavam cheios, Lindinha comprou uma cadeira pertinho do picadeiro. Saiu Aritana numa roupa brilhosa, cabelos bem escovados, e anunciou:

--- Senhoras e senhores, é uma grande satisfação que o Gran Circo Panamericano chega com o seu caste para se apresentar nesta cidade tão bonita, e de moças lindas. A nossa primeira atração são os palhaços, maribondo e chupetinha.

Os dois palhaços entraram, chupetinha era um anã, e maribondo um moreno alto, fizeram sua apresentação. Em seguida, anunciaram o homem que engolia fogo. Aritana chegou de sunga, pegou duas tochas de fogo, passou no corpo, colocou querosene na boca, soprou nas duas tochas de onde saiu duas bolas de fogo, houve outras atrações, e o circo encerrou sua apresentação por aquela noite. Lindinha foi saindo do circo, Aritana estava na porta, perguntou:

--- Gostou da apresentação?

--- Adorei!

--- Posso lhe acompanhar?

--- Claro.

Os dois ficaram na praça em frente da Prefeitura. Ficaram a conversar a te tarde. Já passava da meia noite, quando Lindinha chegou em casa. Dona Doralice estava num pé e noutro, preocupada com a filha. Lindinha empurrou a porta e entrou:

--- Onde você estava Lindinha?

--- Na praça conversando.

No outro dia Aritana passou em frente ao bar e avistou Lindinha, sorriu para ela, e a chamou:

--- Está fazendo o quê?

--- Estou esperando os fregueses chegarem para almoçar.

--- Você está ocupada, senão lhe convidaria para um passeio.

--- Agora não posso. Venha na parte tarde.

Aritana saiu conhecendo a cidade andou pelas ruas, depois foi baixar na cobertura onde os pinguços estavam reunidos chutando um litro de cachaça. Entrou na roda dos biriteiros, fez amizade, meteu o pau na cachaça, pagou mais um litro de cachaça, conversou muito sobre sua vida no Xingu, os novos colegas prestando atenção no que o artista dizia. Terminaram de matar o litro de cachaça, alguns pinguços fora para casa almoça, outros dormiram por ali mesmo, o índio Aritana foi para o circo pegar a papa como dizia os biriteiros.

Á tarde o índio Aritana trocou de roupa, passou perfume, e saiu para encontrar com Lindinha. A encontrou dirigindo um FIAT, assobiou, ela parou:

--- Entre!

Aritana entrou no carro, Lindinha saiu em disparada para os lados do cemitério.

--- Está me levando para onde Sandrinha?

--- Vamos dar uma volta, quero conhecer você melhor.

--- Jogo feito. – disse Aritana.

Aritana contou sua vida toda para Lindinha, disse:

--- Fui convidado para ir para o circo de Beto Carreiro, mais tinha enjeitado. O pessoal que trabalhava com Beto, só ficava preso no Estado de Santa Catarina, eu gosto de andar, conhecer gente, não gosto de ficar preso a serviço nenhum, eu sou um homem livre para tudo, para amar e ser amado.

Lindinha agarrou no pescoço de Aritana, danou-lhe um beijo na boca, ficou em cima dele, se esfregando. Aritana tinha sido o primeiro homem que teve a imensa coragem de se encostar a ela, era muito feia, na primeira oportunidade pegou firme em cima do índio. Passou um gaiato numa bicicleta que iria para a fazenda de José Wilson, soltou a piada:

--- Vai comer aí mesmo, ou vai embrulhar.

Lindinha se recompôs, pegou o carro e saiu para o centro, onde ficava o estabelecimento comercial da mãe. Ficaram de se encontrar depois do espetáculo do circo. Ficando tudo combinado, Aritana ficou na cobertura da feira, junto com os biriteiros que tinham acordado e chegaram para tomar o segundo porre do dia. Aritana falou:

--- Vamos tomar um litro para fazer a hora da janta?

Todos concordaram, Aritana mandou descer um litro de aguardente, comprou uns pastéis secos, que não tinha carne. Os novos amigos puxaram conversa com Aritana, que disse que já tinha arranjado uma namorada, e estava afinsão dela. Contou quem era para os novos amigos. E os pinguços contaram de quem a namorada dele era filha. Deram a ficha da vida da mãe de Lindinha toda. E ainda disseram:

--- Amigo cuidado com a mãe de suvela. A velha não presta para nada, é o satanás em figura de gente. Detesta todos os biriteiros desta cidade, no caso somos nós. Gosta de humilhar, agora a velha tem dinheiro, e cozinha bem. Previniu Zé veneno.

--- Amigo você só vai comer osso, a sua namorada não tem carne nem na bunda para fazer uma coxinha. Já sei que você tem muita coragem mesmo, comer suvela, é ter muita coragem.- Disse Chico bola.

--- Porque vocês chamam Lindinha de Suvela?

--- Meu amigo aquela mulher é muito feia, magra parece uma vara vestida, a venta é fina, parece o cão chupando manga, vive encalhada, nem Santo Antonio ajeita um homem para ela.

--- Pois eu não acho, ela é até jeitosinha.

Os encontros de Lindinha ficaram mais assíduos com Aritana, era um amasso danado, era uma paixão louca. A velha Doralice começou a desconfiar que Lidinha estava fazendo alguma coisa sem ela saber. Fazia mais de quinze dias que o circo estava na cidade, estava chegando á hora de irem embora, no domingo seria o último dia de apresentação do circo, Aritana pegaria um touro brabo á unha e o deitaria no solo. A expectativa tomou conta da cidade, todos os pinguços amigos de Aritana foram convidados para a última apresentação do circo. Lindinha amanheceu o dia chorando, não saberia o que fazer com o amor que tinha guardado no peito que só pertencia a Aritana.

Armaram um curral dentro do circo, Josimar Bezerra emprestou um touro nelore reprodutor que dava até no vento. Nessa noite até Dona Doralice e seu Chiquinho iam ver a façanha de Aritana. A noite chegou o circo estava superlotado, tinha gente saindo pelo ladrão, quando Dona Doralice entrou, os biriteiros quis iniciar uma vaia, o delegado olhou para eles com os olhos feios, pararam. O espetáculo começaria naquele instante. O proprietário do circo fez as despedidas, agradeceu toda cidade pela boa acolhida, e disse:

--- Vai começar o maior espetáculo de coragem de um homem, o índio Aritana, vindo diretamente do Xingu, vai enfrentar o touro nelore do senhor Josimar Bezerra. E com vocês o índio Aritana.

Aritana entrou na arena com uma sunga super justa de cor preta, com uma tira amarrada na cabeça, deu dois saltos mortais, fez um aquecimento mostrando os músculos, e mandou soltarem o touro. Na platéia dona Doralice, falava baixinho para a filha:

--- Que homem maravilhoso é esse meu Deus, faz me lembrar dos meus velhos tempos.

--- O que foi que você disse Doralice?

--- Nada Chiquinho fica na tua.

Lindinha ficou com ciúme da mãe, ela estava se mostrando, quando soubesse que Aritana era só dela.

O touro entrou espantado, ficou mais ainda quando o povo começou a gritar, Aritana no canto da arena, ficou esperando o touro, que foi para o outro canto, partiu pra cima de Aritana, que rapidamente subiu nos paus do curral, o touro sobrou, Aritana escanchosse no lombo do touro, e o touro dava os pulos mais altos possível, Aritana saiu de cima do touro, que atacou novamente, Aritana negou o corpo e o touro sobrou, o animal partiu para cima do índio novamente, esquivou-se e pulou em cima dos chifres do touro, pegou no chifres, torceu o pescoço, e o animal foi arriando, até chegar no chão. O índio do Xingu foi aplaudido esfuziantemente por toda a platéia presente.

Assim que a platéia saiu, começaram a desarmar o circo, viajariam cedo no outro dia. Aritana saiu para encontrar com Lindinha que o esperava no banco da praça em frente da Prefeitura. Lindinha chorava com a separação:

--- Não vá embora Aritana, não me deixe.

--- Não posso Lindinha, eu trabalho no circo, tenho que seguir com eles, Eu sou um artista, vivo do palco, o artista tem onde o povo estar. Do que vou viver nessa terra, aqui não tem emprego, eu sou um artista de grande categoria.

--- Não faça isso comigo Aritana, pelo nosso amor, minha mãe possui um restaurante, vamos todos trabalhar juntos.

--- Dizem que sua mãe é muito braba, e eu não agüento pau no ouvido.

--- Disso pode deixar comigo, que dou um jeito nela.

--- Lindinha eu sou um artista, vivo da arte.

Lindinha saiu arrastando Aritana pelo beco da Prefeitura, e levou a namorado para dentro do muro da mãe dela, onde tinha uma porta no chão, os dois tiraram as roupas e ficaram nus. Começou os amassos, Lindinha com as pernas abertas, e o índio Aritana por cima. O chamego e a vadiagem passavam dos limites. Quando de repente a luz do quintal acendeu, Dona Doralice gritou:

--- Vem ver Chiquinho peguei a ruma, o índio semveigonho tirando o cabaço de nossa fia.

O casal ficou de pé com as roupas cobrindo as partes pudicas, os dois estavam morrendo de vergonha, e a velha gritando:

--- Eu sabia Lindinha que você estava diferente, pegou um caba sem futuro desse para lhe desflorar. Não tinha um macho melhor para você perder o seu cabaço?

--- Mãe nós não estávamos fazendo nada demais!

--- Ora não tava, esse nojento desse índio estava infincado em você, só com as sandálias havaianas de fora. Vai Chiquinho chamar o delegado para resolver esse caso.

O delegado não pode ir até o local, mandou um soldado para acompanhar todos para o quartel. Á frente do quartel estava cheio de curiosos, para saber o que tinha acontecido. Os biriteiros estavam todos juntos para ver no que daria mais aquela confusão da cachorra louca.

--- Pronto Dona Doralice, agora qual é problema?

--- Foi esse índio Aritana que tava comendo minha fia no meu quintal. Quero que o senhor dê um jeito nele.

--- Dona Doralice, vamos maneirar no seu linguajar seboso. Vamos resolver o problema. Sandra ele lhe pegou a força?

--- Não senhor.

--- Quantos anos você tem?

--- 27, vou completar 28 no mês que entra.

--- E o senhor Aritana quanto anos tem?

--- Artista não gosta de falar a idade, mas vou dizer, 32 completo.

--- Então está tudo resolvido, os dois são de maior, não tem problema.

--- Seu delegado ele desflorou Lindinha, tem que ficar preso.

--- Dona Doralice, virgindade não tem mais valor, e os dois são de maior.

--- Essa não Delegado, comigo cabaço ainda tem muito valor.

--- Seu delegado, Aritana não me pegou a força, foi eu mesmo que quis dar para ele.

--- Pronto está tudo resolvido. Podem ir para casa, tenho muito que fazer.

Os pinguços meteram o grito:

--- Arrocha negada, suvela perdeu o cabaço. O índio é corajoso todo, comer suvela é está com muita fome.

A velha Doralice partiu na frente, não queria brigar, estava bastante contrariada com o acontecido. Queria casar Lindinha de véu e grinalda na Igreja, queria fazer uma festa bonita convidar muita gente, não a vergonha que passou.

O circo foi embora. O índio Aritana ficou na companhia dos amigos biriteiros. Na hora do almoço Lindinha trazia o almoço de Aritana que esperava na cobertura da feira, e ali mesmo comia e bebia cachaça com os amigos. Só desta maneira os pinguços provariam do tempero de Dona Doralice. Aritana já estava cheio daquela vida, chamou Lindinha para uma conversa:

--- Sandrinha vou embora, não agüento essa vida, não tenho onde dormir, não tenho parentes, vivo como um miserável. Não preciso viver humilhado por sua mãe que só vive me esculhambando por onde passa. Tenho minha arte sou um artista que é aplaudido por onde passo, não está certo eu viver sendo humilhado.

--- Não se preocupe amor, resolvo essa parada ainda hoje.

Lindinha foi até onde estava á mãe, falaria para ela tudo que tinha vontade, não estava agüentando a vida que Aritana estava vivendo.

--- Mãe vou trazer Aritana para morar aqui em casa.

--- Vai se amancebar?

--- Vou, todos hoje em dia se amigam, até os artistas de Televisão se amancebam e dizem que estão namorando, porque eu não posso me amigar?

Doralice ficou calada, não falou nada, queria muito bem a filha para contrariá-la, aceitaria que Aritana viesse morar dentro de casa.

Aritana foi residir com Lindinha dentro de casa, era um amor maior desse mundo. Lindinha era esterica, quando estava fornicando, gritava tanto que acordavam os vizinhos. Dona Doralice ficava se contorcendo dentro da rede, pensando no que Aritana estava fazendo com a filha. Dona Doralice foi falar com a filha:

--- Lindinha que danado de zuada era aquela ontem de noite?

--- Era eu e Aritana namorando.

--- Minha fia, não faça tanta zuada daquele jeito, que os vizinhos escutam e ficam falando mal de você. E outra coisa eu fico dentro da minha rede que não me agüento.

--- E papai?

--- Seu pai já era faz muito tempo.

Aritana escutava toda a conversa, ficou de orelha em pé, faria uma tragédia naquela família, pegaria Dona Doralice de vez, só podia dobrar aquela velha no pau. Saiu para a rua, foi encontrar com os amigos pinguços. Bebiam cachaça dentro do mercado, ainda não tinham tirado o gosto com nada, estavam bebendo cachaça no cru. Aritana foi à porta do mercado e gritou:

--- Lindinha! Lindinha vem cá.

Lindinha chegou correndo, para saber o que Aritana queria:

--- Diga!

--- Faça um tira gosto para mim, e traga.

--- Aritana você sabe que mamãe não gosta desse povo.

--- Eu não tenho nada haver com sua mãe, eu que quero um tira gosto.

Lindinha preparou um prato cheio de tudo que tinha na cozinha, foi até o mercado, entregou a Aritana. Aritana chegou com o prato de tira gosto, colocou em cima da mesa, os amigos falaram:

--- Porra cara, esse índio tem moral mesmo, está colocando a cachorra louca nos eixos.

Passava das três horas da tarde, o comércio de Dona Doralice estava fechado. Lindinho tinha ido fazer as unhas no alto da estação, seu Chiquinho tinha ido colocar a comida dos porcos, só voltaria lá para as cinco horas. Aritana chegou em casa, Dona Doralice estava só, fazendo um doce de leite. Aritana entrou no quarto, saiu só de cuecas, para tomar banho, a velha quando viu, deu um suspiro, ficou com a cara em brasa. Aritana saiu do banheiro se enxugando, colocou a toalha na cintura, estava sem nada por baixo. Foi se deitar no quarto deitou-se nu, de propósito deixou a porta aberta. Dona Doralice passou, olhou, passou novamente, ficou olhando, Aritana fazendo que estava dormindo. Dona Doralice não se agüentou, entrou no quarto.

--- Se cubra, respeite minha casa.

--- Desculpe Dona Doralice, me cubra, eu estou com sono.

Aritana estava conseguindo o seu intento, queria desfrutar de tudo sem ter que trabalhar. Já tinha dado a primeira entrada, a velha ficou toda vermelha, ela estava precisando de uns amassos, para tirar a metade do stresse.

No outro dia pela manhã, Lindinha avisou que o café estava pronto. Aritana levantou-se foi para cozinha, á cachorra louca estava lavando uma panela na pia, passou roçando na bunda da velha que respirou fundo. Aritana passou meses fazendo assédios para a sogra, a velha estava que não se agüentava mais, á noite ele e Lindinha davam um show de sacanagem dentro do quarto, deixando Dona Doralice na maior tesão em cima da cama, a velha só faltava subir pelas paredes. Seu Chiquinho coitado, todo encurvado dentro da rede, coberto da cabeça aos pés, cansado de lavar as louças e enxugar a cozinha. Não escutava nem o que estava acontecendo dentro de casa. Aritana só estava esperando a oportunidade para amansar a sogra de uma vez.

Dona Doralice estava com enxaqueca, não tinha se levantado nem para trabalhar no bar, estava tudo nas mãos de Lindinha, que cuidava de tudo com o esmero. Aritana estava bebendo no bar de Galego da cajunorte, mandou pirrita pegar um tira gosto de peixe, Lindinha entregou com a cara mais feia do mundo, detestava pirrita. Depois que encheu a cara de cachaça voltou para casa, entrou, o salão do bar estava repleto de pessoas fazendo refeições, não deu nem satisfação a Lindinha, iria deita-se, quando passou pelo quarto avistou a cachorra louca de bunda pra cima com um pano amarrado na cabeça. Aritana entrou no quarto, começou a passar a mão na bunda da sogra, a velha começou a se remexer, Aritana vagabundo, vivido no mundo da safadeza, começou a puxar a bermuda da sogra, e a velha dava um jeitinho para facilitar, a tirada da bermuda. Aritana quando viu a bunda da velha, grande e cheia de estria, colocou um travesseiro debaixo da barriga da sogra, que levantou o corpo para facilitar. Aritana não contou conversa, cravou a espada em Dona Doralice, que gemia bem baixinho, sem fazer nenhum barulho. A velha rebolava que parecia uma rumbeira de circo, e Aritana, que tinha boa boca comia de tudo, não estava nem aí. Terminada a batalha sexual, Aritana foi tomar banho e deitar um pouco. Dona Doralice, só fez subir a bermuda, e continuou deitada com enxaqueca.

No outro dia Dona Doralice amanheceu cantando que parecia um canário da terra, era uma delicadeza que dava gosto, com todos. Aritana passou pela sogra e falou:

--- Está melhor da enxaqueca Dona Doralice?

--- Estou bem melhor, estou até mais calma dos nervos.

--- Com o remédio que senhora tomou, qualquer doença vai embora.

A velha deu uma risada grande estava nas nuvens. Aritana começou a mandar dentro de casa. Dizia ele com sigo mesmo, aqui tem madeira pra todo mundo, agora vou começar o meu jogo.

Aritana era um vagabundo de primeira, louco apaixonado por farra, estava comendo aquelas duas prejuras pela boa vida que estava vivendo. Pegava o carro de Dona Doralice, ia para onde queria, não dava satisfação para os donos. Seu Chiquinho olhava para os desmandos que o índio do Xingu fazia, sem ter o direito de reclamar, não podia abrir a boca que era repreendido por a filha ou pela esposa, que sempre dizia:

--- Chiquinho fica na tua, aqui você não manda em nada.

E Aritana acabando com tudo. Nesse dia inventou uma pescaria no açude Maracajá com o amigo biriteiro Zé Bostinha, mandou Lindinha preparar comida, entrou no bar tirou um engradado de cerveja e uma caixa de aguardente, colocou tudo dentro do carro, colocou mais seis amigos pinguços a bordo do FIAT, e foi embora pescar no açude Maracajá. Dona Doralice e Lindinha ficavam caladas, Aritana estava mandando em tudo. O carro que a família de Lindinha comprou estava todo esculhambado era uma batedeira danada, era um leco, leco danado, o motor estava rajando, saindo fumaça preta, estava prestes a bater o motor. Aritana não estava nem ai. Supria as duas de madeira, elas tinham que agüentar o que ele queria.

O Bar, Lanchonete e Restaurante São Severino dos Ramos, naquela tarde de domingo estava cheio de fregueses comendo e bebendo, o movimento estava muito bom, o povo andava meio liso, quase ninguém tinha dinheiro para gastar. Quando chegaram Aritana e seus amigos pinguços, todos sujos de lama, não tinham pescado nada, estavam todos embriagados. Aritana colocou todos dentro do bar, juntou duas mesas e falou para Sandrinha, vulgo suvela:

--- Amor traga umas cervejas bem geladinha aqui para os amigos.

Lindinha chamou Aritana na cozinha, queria falar com ele algumas coisas que ele não sabia:

--- Aritana, mamãe detesta esses biriteiros que você colocou dentro do bar para beber, estão todos sujos de lama, os fregueses estão olhando de cara feia. Vá beber noutro local.

--- Não me amole Lindinha, deixe que com sua mãe eu me entendo.

Aritana fazia a festa, sem camisa dentro do bar dançando forró, Coisa que Dona Doralice não aceitava, dançava se arreganhava, os pinguços cuspiam no chão, colocavam os pés em cima das cadeiras. Zé Bostinha, Chagas Chambão dançava com uma garrafa na cabeça, Chico Bola chorava, e perturbava nas outras mesas, os fregueses foram se retirando, até o último, ficou só Aritana e seus amigos, comandando a farra. O bar virou um pandemônio. Dona Doralice foi se trancar no quarto estava engolindo toda aquela farra a força. Aritana foi ao banheiro encontrou Seu Chiquinho no corredor, deu-lhe uma tapa na cabeça, e disse:

--- Vamos tomar uma Chico Corninho

--- Não bebo.

--- Seu Chico vou lhe dizer uma coisa, segredo: só quem presta aqui é o senhor.

O velho continuou na sua labuta, lavar os pratos, copos e panelas, calado como um cordeiro, não dava opinião de nada.

Aritana espantou os fregueses todos do bar, não ficou nenhum. Saiu com os amigos novamente para farrear. Saiu no carro numa velocidade que parecia um carro de formula 1, no rumo do bairro São Francisco. Quando chegou na ladeira da ponte, sobrou na curva, caiu de cima da ponte. A felicidade que escaparam todos, mais o carro só servia para o ferro velho. Levaram todos para o hospital, trataram dos ferimentos e foram embora para casa. Dona Doralice vendeu o carro por quinhentos reais. Aritana com a cara toda ferida, pegou doze pontos na cabeça. Ficou de cama por quinze dias tratado a pão-de-ló por Lindinha e a cachorra louca.

Com a confusão de Aritana, os fregueses de Dona Doralice começaram a rarear, não tinha mais a freqüência dos que se dizia á elite de Pedro Avelino. A convivência com Aritana era difícil. Aritana entrou num jogo de baralho, foi três dias com três noites jogando, quando o dinheiro se acabava mandava pegar mais com Dona Doralice. Perdeu uma porrada de dinheiro. Chegou em casa, Lindinha veio reclamar da vida que ele estava levando, não estava dando certo:

--- Eu não quero papo agora, deixe-me dormir.

O movimento do bar estava fraco, os fregueses tinham se afastado, nem o tempero de Dona Doralice chamava mais atenção da população que freqüentava o bar, estava tudo indo de água a baixo. O trabalho de seu Chiquinho diminuiu, já não tinha tanta gente para sujar pratos, Dona Doralice dispensou duas ajudantes de cozinha, o bar estava entregue as moscas. Aritana continuava farreando com os biriteiros seus amigos. Só chegava embriagado. Dona Doralice só agüentava tudo aquilo de Aritana porque ele fazia a felicidade dela na cama. Lindinha do mesmo jeito. Seu Chiquinho calado vivia na dele, não tinha direito de dar opinião. Dentro do Mercado Público Aritana farreava com os amigos, Nininho Aleijado perguntou:

--- Aritana como é lá no Xingu?

--- Que porra de Xingu que nada, eu não sei nem onde fica. Eu sou de Lagoa Nova, eu era guia de cego. O cego tinha dinheiro que só a porra debaixo do colchão, eu peguei e levei, deixei o cego falando só. Depois fui bater estaca num circo grande, passei uns cinco anos, aprendi a fazer essas besteiras para ganhar dinheiro.

--- E essa musculatura toda?

--- Isso foi de fazer força no circo e bater estaca. Também trabalhei no circo cuidando dos leões, bicho traiçoeiro.

--- Cuidando como?

--- Dando de comer a eles. Quem tinha um cavalo velho que não servia mais para trabalhar, ia ao circo e vendia. O dono do circo mandava eu e mais dois matar o cavalo para dar de comer as feras. Às vezes até eu os outros comia carne de cavalo assado, é a mesma coisa de carne de gado.

--- Mudando de assunto Aritana. A cachorra louca tá quebrada, não entra mais ninguém no bar.

--- E eu com isso!

--- Mas foi você que quebrou as duas!

--- Quem quer homem bom de cama, tem que gastar.

--- Quer dizer que você está comendo as duas.

--- Claro, só não como velho Chico Corninho porque ele não me dá.

--- Porra cara, como tu és escroto.

Aritana foi até o bar, a procura de dinheiro, quando chegou lá veio á negativa:

--- Quero dinheiro Doralice.

--- Não temos. Faz dias que não vendemos nada.

Aritana olhava o estrago que tinha feito, não tinha mais nada dentro do bar, até uma televisão e um freezer Doralice tinha vendido, não entrava ninguém, nem os pinguços queriam entrar no bar da cachorra louca. Quando Aritana viu que não tinha mais nada para fazer, se mandou foi embora ninguém sabe pra onde.

Dona Doralice e a família ainda agüentaram uns três meses, resolveram ir embora, depois de quinze anos em Pedro Avelino. Doralice vendeu o prédio do bar a Manoel Xareu. Na hora da assinatura dos papeis, Seu Chiquinho falou:

--- A metade do dinheiro é meu!

--- Negativo é todo meu, foi eu que trabalhei para comprar o prédio.

--- E eu fiz o que Doralice?

--- Você só fez ajudar um pouquinho.

Levaram o caso para justiça, que deu ganho de causa a seu Chiquinho que recebeu sua parte e colocou numa poupança no Banco.

Dona Doralice resolveu ir embora, arrumaria as coisas que restou, fretaria o caminhão de Ernesto, só não dizia o seu destino. Seu Chiquinho estava embaixo da cobertura, tomando uma cerveja num trailer, quando chegou Dona Doralice:

--- Você está bebendo Chiquinho? Que folga é essa?

--- Estou curtindo!

--- Vamo levanta vamo arrumar as coisas.

--- Eu não vou para lugar algum, vou ficar aqui.

--- Eu não acredito no que estou escutando. Vamo Chiquinho levanta, vamo trabalhar.

--- Não vou Doralice, cansei de ser mandado por você, cansei de levar chifre, você agora segue sua vida, que eu sigo a minha.

--- Papai eu não acredito que o senhor vai deixar agente?

--- Pode acreditar Sandra, eu não sei nem se você é minha filha, eu tenho impressão que sua mãe não sabe nem quem é seu pai.

Dona Doralice foi mais à filha arrumar o que tinha. Partiriam de madrugada para ninguém ver. Só que Ernesto avisou aos pinguços que ela partiria de madrugada. Os biriteiros passaram a noite de campana esperando a partida da Cachorra louca. Quando tudo estava em cima do caminhão, que Ernesto deu partida no seu transporte, os pinguços apareceram, cobriram Dona Doralice na vaia, e ela descompondo a todos, Chambão ainda gritou:

--- Já sei, a senhora deve ir morar na casa de sua amiga Ana Maria Braga.

Manoel Julião neto