quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Reginaldo Rossi esta P. da Vida

Naldo estava todo molhado na ponta da calçada, se enxugando ao sol. Os olhos vermelhos de chorar, os beiços tremiam de frio, a cabeça dos dedos dos pés cheios de feridas das topadas que levava. Andava na ponta do pé direito, de uma estrepada que levou no calcanhar de um espinho de algaroba. Quando saía para escola, era o pé esquerdo no sapato e direito na chinela, não podia entrar na escola só de chinelas. Só tinha 11 anos mais era um menino revoltado. As revoltas de Naldo eram grandes por ser criança. A começar pelo nome que sua mãe lhe botou, Reginaldo Rossi, servia de mangação e de deboche para todos, principalmente na escola, quando a professora fazia a chamada e dizia: Reginaldo Rossi da Silva! Seus amigos da escola caiam na risada, até a professora ria baixinho escondendo o rosto com a caderneta de chamada. Ele não podia pagar por sua mãe ser fã do artista, ainda tinha uns amigos que diziam: Reginaldo Rossi canta garçom. A professora fazia questão de chamá-lo por Reginaldo Rossi. Já tinha pedido a professora para chamá-lo só de Naldo. E ainda tem música que diz: que saudade da professorinha, que me ensinou o bê-a- bá.
Sua mãe quando queria lhe chamar fazia questão de gritar bem alto:
--- Ô Reginaldo Rossi venha para dentro de casa, saía do meio da rua, que você na rua só arranja encrencas.
Ela tinha prazer de lhe chamar por aquele nome horroroso que todos debicavam dele. Até os médicos quando ia se consultar no posto de saúde perguntavam:
--- Você sabe cantar alguma coisa?
Sentindo-se ridicularizado com aquele nome que ele não gostava nem de pronunciar, foi falar com o Juiz no fórum.
--- Quero falar com o Juiz!
--- O Juiz está muito ocupado para atender a criança. – disse o secretário.
Ficou esperando na frente do prédio do fórum, até a hora que o Juiz sairia para almoçar. O Juiz foi saindo, Naldo aproximou-se, perguntou:
--- Posso falar com o senhor?
--- Claro, diga garoto!
--- Acontece que eu tenho um nome que não gosto, queria saber se quando eu crescer posso mudar?
--- Que nome tão feio é esse meu filho?
--- O nome não é feio, mas eu não gosto.
--- Qual é?
--- Reginaldo Rossi! E ainda tem uns que mandam eu cantar garçom!
--- Está certo, o nome não é feio, mas se lhe incomoda, e você se sente humilhado com o nome, quando você passar para maior idade pode mudar. Porque sua mãe não muda agora?
--- Ora seu Juiz se foi ela que botou, ela é fã desse artista. Não quer ver nem falar que eu mude de nome.
--- Agora é com você, fique de maior e mude de nome.
Quando saía com a mãe para qualquer local onde tinha muita gente, ela fazia questão de chamá-lo por aquele nome, nome chato de se aturar. E quando alguém perguntava o seu o nome ficava calado, a mãe o forçava a dizer:
--- Diga seu nome meu filho, diga!
Respondia constrangido, e com muita vergonha.
--- Reginaldo Rossi da Silva!
E quem perguntou respondia apertando-lhe as bochechas:
--- Que bonitinho.
Naldo só faltava se enterrar no chão. Não sabia porque sua mãe fazia tanta questão que ele pronunciasse o seu nome com tanta eloqüência. Porque sua mãe fazia tanta questão de lhe humilhar de tal maneira. Devia as pessoas que escolhesse o seu nome quando crescesse e também escolher os padrinhos, as vezes os pais escolhem para padrinhos dos filhos pessoas tão antipáticas que o afilhado custa a engolir, não toma nem abença.
A outra revolta de Naldo, era porque estava demorando muito a completar 18 anos, queria ser de maior, para mandar na sua vida, para ninguém mandar nele. Vida de menino é uma desgraça, dizia Naldo. Quando os adultos estão na sala conversando, menino não pode falar, e quando fala leva um esbregue do pai, se dão um peido fedorento, quem leva a culpa? É o menino ou o cachorro, se não tiver cachorro, foi o menino, e o pai manda se retirar para não incomodar os mais velhos. Se for para fazer um mandado quem vai? O menino. Todo menino do interior, por qualquer coisa leva um muchicão ou uma surra, já tem uma sola na parede pendurada só para ele apanhar. Ao contrario dos meninos criados nas capitais, tem deles que manda nos pais. Mas no interior o negócio é diferente, o menino está sempre errado.
O que mais deixava Naldo chateado é tomar banho todos os dias. Criança não gosta de banho, dizia Naldo: devia ser dois por semana, os restantes dos dias só lavar os pés, os braços e o rosto. Escovar os dentes todos os dias, a mãe o obriga, ou escova os dentes ou apanha, e agora a mãe de Naldo viu na televisão que tem que escovar os dentes até para dormir. A mãe de Naldo copia tudo que ver na televisão. Naldo pensa só com ele: tomara que ela não aprenda a botar chifre como nas novelas.
A surra que Naldo nunca esqueceu, foi quando pegou dois colegas seus trocando os cus, contou ao pai, levou uma surra, o pai disse que ia bater nele para ele não fazer a mesma coisa, essa surra foi injusta. Ele era macho, o cara que fizesse essa proposta a ele ia para o cacete.
Tá certo que todo menino faz suas traquinagens. Um dia seu Belmiro veio enredar a mãe, dizendo que ele estava comendo a burra dele dentro dos carnaubais, ora se aquilo era nada demais, a burra era bem mansinha, nem achava ruim, ela mesma procurava os meninos, até o velho Belmiro também fazia a mesma coisa com a burra, ele estava era com ciúmes. Agora cabra é mais difícil, tem que pear as patas traseiras, senão ela escapole e vai embora, não tem quem pegue.
Nininho se aproximou e perguntou a Naldo porque ele estava chorando naquele sol quente:
--- Porra Nininho, não estou mais agüentando mais essa vida de ser criança, todos os mandados daqui de casa quem faz sou eu. Tudo que faço está errado, ninguém me dar razão. Ainda tem gente que sente saudade de do tempo de criança. E ainda tem uma música que diz: eu era feliz e não sabia.
--- Isso passa Naldo, quando você ficar adulto, vai se lembrar com saudade das suas estripulias.
--- Eu quero completar logo 18 anos, quero, beber cachaça, fumar, jogar baralho e raparigar, quero ver se pai vai bater em mim. Vai uma porra, eu sou o pau de limpar cu daqui de casa, até meus irmãos que deviam ser do meu lado, são os primeiros que fazem enredo de mim para papai. Minhas irmãs vivem se esfregando nos machos na frente de pai e de mãe, são as moças mais faladas da cidade, lá em casa não dizem nada, mais quando eu erro, é pau.
--- Todo menino passa por isso Naldo, eu também já apanhei de papai quando era criança.
--- Olhe só Nininho se eu não tenho razão. Um dia desse eu fui tomar banho no poço do machado, papai foi me buscar, veio de lá até em casa me batendo com um molho de salsa roxa, se eu fosse de maior, ele não tinha me batido.
--- Porra Naldo, você num fica reclamando que tem raiva de banho, como é que vai tomar banho no poço do machado?
--- Banho de poço é outra coisa. Ruim é banho obrigado.
--- Tenha paciência Naldo, um dia você vai crescer e vai dar risadas do que está acontecendo hoje com você, olhe o que estou lhe dizendo.
--- Pode ser Nininho, mas eu acho muito difícil esquecer as surras que já levei.
E Naldo continuava sentado na ponta da calçada com os cabelos todo arrepiados, pensando na próxima traquinagem que faseria naquele dia quente de outubro, e lá de dentro de casa a mãe gritava:
--- Chega pentear o cabelo Reginaldo Rossi!
--- Pera ai que já vou.
E dizia baixinho: - um dia eu vou me chamar Roberto Rivelino.

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