domingo, 20 de fevereiro de 2011

O CASAMENTO DE VALDEMIR COM MAROCA

Valdemir moleque novo criado nas várzeas do rio Açu, taludo acostumado a comer peixe com batata doce na beira do rio, namorador por natureza, por onde passava deixava alguém chorando por ele. Um dia nas suas andanças bateu com os costados aqui em Pedro Avelino, vinha a procura de trabalho, não enjeitava trabalho pesado, o que aparecesse ele traçava, tinha disposição para qualquer serviço. Começou a trabalhar na olaria de Zé piaba, fazendo telhas e tijolos, e a mulher de Zé piaba era louceira fazia panelas, agridás e potes e quartinhas, todos da família sobreviviam do barro.
Valdemir era macho trabalhador da peste, ganhou logo a simpatia de Zé piaba. Moleque enfronhado conquistador e audacioso para cima de mulher, a mãe já tinha lhe dito, - um dia uma mulher lhe da água de priquito e ajeita sua vida.
Pegou logo um namoro com Maroca, filha de Zé piaba, era namorão arrochado danado, namoro pra casar mesmo. Mas dizia o moleque Valdemir: O que mais me deixou apaixonado foi o pé de rabo de Maroca, o rabo era grande e boleado, desses que quando ela andava balançava de um lado para outro, e a dona do rabo não deixava ele passar nem a mão, dizia: que era moça direita, que quem quisesse passar a mão na bunda dela tinha que casar. O conquistador não resistiu os ancantos da namorada. No sábado foi á feira comprou as alianças, pagaria em três prestações de partes iguais.
Pediu a Zé piaba a mão de Maroca em casamento, Zé piaba concedeu imediatamente, também ficou muito satisfeito, pois Valdemir era um rapaz bom e sem vícios, só bebia uma cachacinha de vez em quanto, fazia de todo gosto o casamento. E o moleque Valdemir ficou noivo, bem que a mãe dele disse: que um dia uma mulher pegaria ele pelo pé.
Maroca meteu o pau a se arrumar para casar, Já estava com o baú cheio de tudo, lençol de cama, toalhas de banho e de rosto e fronhas e outras coisas mais. A mãe de Maroca tinha encomendado o vestido do casamento a Bia, que era a costureira da região, e morava na propriedade São Pedro. Zé piaba capou um porco para engordar, a mulher separou três perus para serva, todos os dias a velha colocava 2 quilos de milho de molho, empurrava de goela abaixo dos perus para ficarem gordos, tudo isso para o casamento de Maroca.
Eram todos trabalhando com dedicação em prol do casamento da filha mais velha de Zé piaba. Maroca estava com a louça de barro toda pronta para sua casa. Valdemir tinha comprado toda mobília no meio da feira, uma cama patente, com colchão de capim, um camiseiro e uma mesa e quatro tamboretes, o armário da cozinha ia ser feito de caixão de sabão patativa. Aquele seria o maior casamento da fazenda alagamar, tudo pronto, tudo nos conforme, Zé piaba e Valdemir vieram até a paróquia de Pedro Avelino, falar com o vigário da freguesia, Padre Antas para realização do casamento. Padre Antas era temperamental, quando pegava marcação com uma pessoa ia longe, e quando estava de lua, não tinha quem agüentasse seu gênio.
O Padre começou logo empombando, dizendo que Valdemir tinha sido batizado em Açu, que tinha que requisitar o batistério dele para poder ser concretizado o casamento, e também tinha que correr os banhos, que o casamento só podia acontecer daquela data há trinta dias para frente. Valdemir comprometeu-se ir buscar o batistério em Açu, o padre não aceitou, disse:
--- O batistério tem que vir através da Igreja.
--- Eu sou de confiança, conheço o Padre Canindé de muitos anos, ele faz isso pra mim na hora que eu chegar lá.
--- Acontece que a igreja católica tem seus tramites legais, não é assim do jeito que o povo pensa.
Tudo acertado com a igreja, só faltava ajeitar no cartório, mas no cartório era moleza, só era falar com Xavier, ele fazia o casamento na hora, recebia o pagamento até em galinhas e ovos, saía bem baratinho. Zé piaba avisou a todos de casa que o casamento seria daqui a um mês.
O vestido de noiva de Maroca estava pronto, Valdemir tinha comprado a sua indumentária nas bancas da feira, inclusive a gravata preta que ia usar no dia, estava tudo na medida. Os sapatos quem ia trazer era sua mãe que morava no Açu. Só faltava chegar o dia do casamento, para ele sarrabuiar Maroca, isso não saía da sua cabeça, pensava na traseira de Maroca vinte e quatro horas por dia.
Finalmente chegou o dia do casamento, estavam todos ansiosos com a data. Caiu num sábado dia da feira de Pedro Avelino. Na sexta-feira mataram o porco capado, dois carneiros, os três perus e uma porrada de galinhas, o sanfoneiro também estava contratado.
No sábado logo cedo Zé piaba colocou os potes, as panelas e os agridares em cima da carroça, e quando chegasse na rua entregaria direto a Avelino Salvião, que era o vendedor de mangaio da região. Maroca subiu na carroça com seu vestido branco com faixa na cintura da mesma cor, grinalda e boquê na mão, depois subiu a mãe e depois Valdemir todo engravatado, todos no meio das louças de barro, e Zé piaba saiu puxando o burro da carroça de estrada fora, em procura da rua de Pedro Avelino. Deixaram em casa o homossexual chamado João Nôga tomando conta das panelas, o porco já fervia dentro do tacho de barro desde madrugadinha, tinha comida e bebida pra quem chegasse, toda região da fazenda Alagamar foram convidados. Chegando na feira Zé piaba entregou a louça a Avelino Salvião, e foram todos para Igreja. Maroca de braço com Waldemir, o povo nas calçadas olhando, o belo casal que se casaria naquela manhã na missa dos agricultores que era celebrada no sábado pela manhã.
Igreja cheia, o povo de Alagamar veio todos, e o padre celebrando a missa, Valdemir não estava agüentando os sapatos apertando seus dedos, não podia nem se escorar, estava nos bancos da frente, mesmo em frente ao altar. Terminada a missa, o padre ia saindo para a casa paroquial, Zé piaba indagou:
--- Padre e o casamento?
--- Que casamento?
--- O de Valdemir com Maroca, o senhor marcou pra hoje.
--- Só que o batistério dele ainda não chegou, só sábado que vem.
--- Mas isso não está direito, já matamos os bichos pra festa, passamos a noite quase todo pelando o porco, Maroca com a mãe despenando galinhas e perus, e os meus meninos matando os carneiros, não dormimos, e agora o senhor me diz que não vai ter casamento.
--- Isso mesmo, não vai ter casamento, só sábado.
Não houve casamento, voltaram pra casa, comeram o porco os perus, dançaram a noite toda, e Valdemir não matou o peba de Maroca, também não teve o direito de passar a mão na traseira dela.
Passaram a semana trabalhando no artifício do barro, queimaram dois fornos de tijolos, cada um quinze milheiros, e um forno de telhas, de três mil. Finalmente chegou o sábado, Maroca vestiu-se de noiva novamente, o vestido estava todo amarrotado, Valdemir colocou a gravata e o sapato apertado, e lá vieram todos de novo em cima da carroça, Zé piaba puxando o burro, não ia haver festa, a festa tinha sido sábado passado. Chegando na Igreja, assistiram a missa, e depois o padre disse:
--- Não vai haver casamento, o batistério ainda não chegou.
--- Mas seu Padre isso já está me deixando aborrecido, parece que o senhor está fazendo de propósito.
--- Casamento só quando chegar o batistério. Você quer mandar nas coisas da igreja Zé piaba?
--- Não senhor.
Voltaram novamente para casa, e de novo Valdemir não matou o peba de Maroca. No outro sábado a mesma sacanagem, o padre disse que não ia haver casamento, dizia e saía rindo, o padre estava fazendo isso só de sacanagem. E Zé piaba reclamava:
--- Uma coisa dessa não pode, três sábados que o padre adia esse casamento, só digo uma coisa a vocês, sábado vai ter casamento.
Zé piaba comprou um porco, mandou matar, matou as galinhas todas do terreiro, dois cabritos, e contratou o sanfoneiro.
No sábado Maroca vestiu o vestido todo amarelado da poeira da estrada, e Valdemir de gravata, vieram no meio da louça que a carroça trazia. Chegando na igreja a missa tinha começado, o padre estava levantando o cálice, quando Zé piaba entrou com seu pessoal, mas de quinze pessoas, disse:
--- Como é padre vai casar Maroca com Valdemir hoje?
--- Ainda não, o batistério ainda não chegou.
A igreja repleta de fies, todos ficaram olhando aquela interrupção da missa, quando Zé piaba abriu o bocão bem alto:
--- Pôs tá bem padre. Valdemir vem cá, o porco está fervendo dentro do tacho lá em casa, nós come, as galinhas também nós come, o sanfoneiro está pago, nós dança. Você pega Maroca e leva pra casa do alto, tá qui a chave, e estraçalhe a boceta de Maroca do jeito que você quiser, rasgue a boceta de Maroca em oitocentos mil pedaços, do jeito que você entender, que casamento na igreja hoje não vale merda nenhuma, e o bicho pior que existe é Padre vamos embora que eu já estou cheio da cara desse Padre.
--- O que é isso Zé piaba, assim mesmo sem o batistério de Valdemir, eu vou fazer o casamento. Á muito tempo que eu estava pensando nisso.
Valdemir e Maroca casaram, foram para a fazenda, o sanfoneiro tocou a noite toda, e finalmente Valdemir matou o peba de Maroca e teve direito de passar a mão na traseira dela.

Manoel Julião Neto

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